Dois projetos econômicos em disputa: tréplica a Armínio Fraga

do Brasil Debate

publicado na Folha de S.Paulo

Jorge Mattoso e Pedro Rossi

Ainda que o clima eleitoral possa encorajar posturas mais militantes, esperávamos que um economista experiente como Arminio Fraga se dispusesse a dialogar com opiniões divergentes com alguma serenidade. Lamentamos o tom e os termos de sua resposta ao nosso artigo publicado em 1º de setembro neste mesmo espaço.

Mesmo assim, agradecemos sua resposta. Ela reforça nossa constatação de que desqualificar o interlocutor e apresentar questões econômicas como um problema técnico seriam apenas uma tentativa de esconder divergências essencialmente políticas ou determinados interesses econômicos.

Divergências no campo da economia têm diferentes pontos de partida. O paradigma keynesiano fundamenta o papel do Estado na preservação de bancos públicos, no incentivo à diversificação da estrutura produtiva, no provimento de serviços sociais universais e na redução das desigualdades. Nessa perspectiva, os mecanismos de mercado seriam incapazes de garantir uma distribuição de renda mais igualitária ou o acesso de todos aos direitos sociais fundamentais.

Já o paradigma neoclássico, que fundamenta o atual liberalismo econômico, tem outra visão do papel do Estado e das políticas sociais e da desigualdade de renda. Alguns economistas neoclássicos, como Gregory Mankiw, justificam explicitamente a desigualdade de renda e os supersalários do setor financeiro alegando que as remunerações de mercado refletem a meritocracia e remuneram fatores de produção de acordo com a contribuição que esses proporcionam à sociedade.

Esse argumento crê que a criação de riqueza depende de incentivos de renda. Por isso, a desigualdade seria funcional ao crescimento e deveria ser “corrigida” pelo próprio mercado. Com relação às políticas sociais, os neoclássicos defendem a focalização em detrimento do acesso universal aos serviços sociais. Ao Estado caberia apenas cuidar dos mais pobres, enquanto os demais buscariam no setor privado o atendimento de suas demandas.

Portanto, além de refratários à distribuição da renda, há também evidentes contradições entre a visão neoclássica e o Estado de bem-estar proposto pela Constituição de 1988.

No debate brasileiro, os economistas neoclássicos mostram seu liberalismo ao defender a redução do Estado no setor produtivo e no sistema financeiro. Mas quando tratam da questão social e distributiva, o liberalismo esbarra em suas próprias contradições. Talvez venha daí a dificuldade de Arminio Fraga em explicar claramente aos brasileiros por que os salários cresceram “muito” e por que, na visão dele, isso seria ruim para a economia e a sociedade.

Essas concepções marcam a diferença entre um projeto econômico liberal e outro em que o Estado seja ativo na garantia dos direitos sociais e na busca do crescimento econômico com distribuição da renda.

O projeto liberal reaparece nas candidaturas de Aécio Neves e de Marina Silva trazendo de volta a possibilidade de o país retomar um padrão de crescimento concentrador de renda e de desmontar nosso incipiente Estado de bem-estar social.

Em contrapartida, nos últimos 12 anos, o Brasil caminhou na direção da redução de nossa histórica desigualdade de renda –mesmo em meio à turbulência da crise internacional– e a candidatura da presidenta Dilma Rousseff vem reafirmando esse compromisso.

Se ninguém tem o monopólio do repúdio à pobreza, existem concepções diversas sobre igualdade, meritocracia e justiça social que diferenciam os dois projetos econômicos em disputa nesta eleição e que precisam ser cada vez mais explicitadas no debate público.

JORGE MATTOSO, 64, economista, é professor aposentado da Unicamp. Foi presidente da Caixa Econômica Federal (2003-2006)
PEDRO ROSSI, 33, é professor do Instituto de Economia da Unicamp

Redação

11 Comentários

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  1. Qualquer um tem o direito de

    Qualquer um tem o direito de escolher qualquer dos candidatos.

    E tem a obrigação de saber as suas propostas

    Na área econômica Aécio e Marina defendem o neoliberalismo. Dilma defende o desenvolvimentismo.

    Votar sem saber a diferença entre essas correntes e o que elas representam para o Brasil é voto de mentes que aceitaram a lavagem cerebral

    1. E no caso do aécio, Assis,

      E no caso do aécio, Assis, eles já mostraram a política econôomica e a política social deles. Mas no caso da marina ela vem dizendo que vai manter a política social do lula e dilma mas com a política econômica do psdb; como se fossem coisas compatíveis. Ou ela está muito iludida ou se entregou de vez à demagogia. Nas duas hipóteses é um retrocesso.

  2. Acho que nao em qualquer

    Acho que nao em qualquer lugar do mundo uma sociedade que aceite escutar que os direitos trabalhistas devem ser cortados para o “bem maior”. Nem mesmo nos paises didos “avancados”.

    1. Reforma do mercado de

      Reforma do mercado de trabalho e sistema social alemão completa dez anos

      Para muitos, a Agenda 2010 do governo Gerhard Schröder é a grande responsável pela economia estável e pelo desemprego baixo da Alemanha. Mas salários menores e distorções sociais são apontados como outro lado da moeda.

      Para o economista Hans-Peter Klös, está acima de qualquer dúvida: é sobretudo graças ao programa Agenda 2010 que o desemprego hoje na Alemanha é menor do que dez anos atrás. O diretor do departamento Política de Formação Profissional e Política de Mercado de Trabalho do Instituto de Economia Alemã (IDW), de Colônia, está convencido de que o abrangente pacote de reformas foi decisivo para desdobramentos positivos no mercado de trabalho do país.

      “No contexto internacional, não estamos mais ocupando o fim das listas de ranking, e sim o primeiro um terço”, declarou Klös à Deutsche Welle. “Quer dizer, a Europa olha para a Alemanha e se pergunta: como pôde acontecer essa virada para melhor?”

      Polêmico Hartz IV

      Desemprego ainda é menos grave na Alemanha do que em outros países da UE

      O economista não é o único a fazer um balanço positivo: numerosos políticos e economistas elogiam a Agenda 2010, que em meados de março completa dez anos. Ela foi idealizada e executada pela coalizão entre social-democratas e verdes que em 2003 governava a Alemanha.

      O programa foi criado com o fim de reestruturar os sistemas sociais e o mercado de trabalho no país. O resultado, afirmam muitos especialistas, foi o aumento da competitividade internacional da economia alemã. Por causa da Agenda 2010, argumentam, a economia da Alemanha vai bem, e o país não tem os problemas de desemprego da Grécia e da Espanha.

      O pontapé inicial nas reformas foi dado pelo então chanceler federal, o social-democrata Gerhard Schröder, com uma declaração governamental no Parlamento, em 14 de março de 2003: “Vamos ter que reduzir os benefícios do Estado, incentivar a responsabilidade própria e exigir maior empenho de cada indivíduo”.

      Schröder nos tempos da Agenda 2010

      Concretamente, isso significou, entre outras medidas, a elevação da idade de aposentadoria para 67 anos, contribuições mais altas para o sistema de saúde, assim como a combinação de seguro-desemprego com seguro social, sob o cognome Hartz IV. Este desencadeou acalorados debates, mesmo dentro do partido do governo, pois, para muitos desempregados, representava menos apoio estatal.

      O salário padrão do Hartz IV é de 382 euros por mês, mais auxílios para aluguel e calefação. Quem requere o benefício tem, além disso, que se apresentar regularmente à agência estatal de trabalho e eventualmente também aceitar ofertas para empregos menos qualificados. Tal comprometimento causou descontentamento em muitos trabalhadores qualificados – experientes porém desempregados, sobretudo nas regiões estruturalmente carentes.

      Vantagens e desvantagens controversas

      Ulrich Schneider, diretor-geral da associação beneficente Paritätischer Wohlfahrtsverband em Berlim, avalia negativamente a Agenda 2010, e em especial a introdução do seguro Hartz IV. “O Hartz IV fez com que nós desenvolvêssemos na Alemanha um setor de baixos assalariados extraordinariamente grande. Hoje, quase um quarto dos autônomos trabalha por menos de 9,15 euros a hora, em média até 6,60 euros. Essas são as consequências da Agenda 2010.”

      Manifestação em Berlim, 2006: “Hartz IV faz a gente triste”

      Até mesmo Frank-Walter Steinmeier, chefe da bancada parlamentar do Partido Social Democrata (SPD), reconhece essa distorção social. Na época, ele colaborou decisivamente para definir as reformas. Ainda assim, está convencido que a Agenda 2010 salvou a Alemanha de um colapso econômico.

      “Se naquele tempo Schröder tivesse governado a Alemanha com tão pouca coragem como Angela Merkel hoje em dia, nós estaríamos agora diante de problemas bem maiores, em pé de igualdade com a Itália, a França e a Espanha”, declarou Steinmeier ao jornal Süddeutsche Zeitung.

      É discutível se foram realmente as reformas do mercado de trabalho que levaram à redução das taxas de desemprego. Fato é que o número de desempregados na Alemanha caiu sensivelmente nos últimos sete anos: eles são “apenas” 3 milhões em 2012, contra mais de 5 milhões em 2005. Mas os especialistas também são unânimes quanto à necessidade de melhorar a situação nos postos de trabalho que exigem menor qualificação.

       

       

  3. Meritocracia

    Não é possivel se falar de meritocracia quando nas universidades públicas entram em sua maioria alunos bem nascidos que foram formados por colégios particulares. Ou quando se passa fome.

    A palavra meritocracia deveria ser mudada, nesse bordão liberal, para networking. É o networking que mantém a classe dominante no poder, lhe rendendo oportunidades que são negadas aos reles mortais.

  4. Abaixo as baboseiras econômicas!

    Antes de mais nada respeito as pessoas que estudaram e estudam a tal de ciência econômica.  Nesse sentido, respeito o Arminio, o Gianetti e quem quer que seja. 

    Isso é uma coisa.

    Outra coisa é acreditar que os militantes dessa  “ciência” são  capazes de diagnosticar, explicar e , na sequencia, propor e implementar alguma coisa num ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.

    É realmente incrível como ainda há pessoas que acreditam nisso.

    Noutras palavras, o caboclo faz lá o seu diagnóstico econömico e, a  partir dai, acredita ou tenta fazer acreditar que  tocará o ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, que se fundamenta na CONSTITUIÇAO DA REPÚBLICA DE 1988.

    Ora, como alguém ainda pode acreditar nessa baboseira!?

    Será que um parlamento reduzido de “economistas” com suas teses, correntes de pensamento, baboserias mil, podem elaborar a LEI ECONÖMICA ( evidentemente, ofertando e demandando “vontades”)  para TOCAR O PAIS que , felizmente, nasceu democrático e de direito em 1988? Será mesmo? Alguém acredita nisso ainda!?

    Para os DESORIENTADOS que acreditam nessa baboseira é preciso dizer o seguinte:

    Acreditem no ORÇAMENTO PÚBLICO, inclusive , no do seu ESTADO FEDERADO  e no do seu  MUNICIPIO ou do DISTRITO FEDERAL.

    Nesse instrumento temos condições de enxergar como O BOLO SERÁ DISTRIBUIDO. Melhor ainda, antes desse BOLO, é preciso compreender DE ONDE VEM OS INGREDIENTES DESSE BOLO.

    Vêm , sobretudo, das RECEITAS as quais vão proporcionar GASTOS ( despesas e investimentos )  São elas o fermento do bolo. São elas , receitas originárias e derivadas, que   vão nos mostrar o CONFLITO DE INTERESSES que cairá na mão de um CHEFE DO EXECUTIVO para que este faça a PROPOSTA DE DIVISÁO DAS FATIAS DO BOLO!

    E isso é feito por LEI, dentro de um ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO!

    A baboseira ECONÔMICA vai para o ESPAÇO na ora de votar a tal  LEI!!!

    Cada um vai querer defender o SEU. E dane-se o restante. Eis o espírito animal, misturado com mão boba e invisível versus welfare state etc.

    Alíás, como  dizem por ai, dentro de nossos parlamentos o que mais tem é espírito aninal! ( deixo para vocês escolherem o animal de sua preferência para representar esse “espírito”!) Certo?

    Baseando-se nisso, e de acordo com as FORÇAS POLÍTICAS deste BRASIL, é óbvio concluir que medidas impopulares soam, no mínimo,  inconstitucionais!  O chefe do órgáo do poder  executivo REPRESENTA O POVO e  nâo deve e nem pode agir assim CONTRA o POVO! 

    Chamem qualquer economista do mundo para que este traga  o modelo , a tese, a corrente , enfim, qualquer dessas BABOSEIRAS econömicas para CONVENCER os otários.

    Não convence mais!

    O  número de OTÁRIOS tem reduzido bastante ultimamente. Esse é o ponto.

    Nesse sentido, penso que sua excelência , certamente, será vencedora   nas próximas eleiçoes não apenas no executivo federal.

    Vencerá  o JOGO POLÍTICO!

    E espero que o BOLO do Brasil continue na mão do Brasil!

     

    Saudaçoes

     

     

  5. Aécio Neves

    Não se pode esperar serenidade dessa gente ,Aécio Neves em uma entrevista na Record ,gabou-se de fazer parte de uma equipe que reduziu a inflação de mais de mil por cento ano para 8% (desnecessario lembrar que a URV não é obra tucana) e que foi LULA que elevou a inflação para 12% ano,quando o assunto é Petrobrás nunca mencionam a produção que cresce a niveis geometricos diariamente apenas falam em má gestão adminstrativa , vivem no mercado e as vezes esquecem que estão em publico e falam que vão promover ” ajustes no mercado de trabalho para que os salarios se ajustem” ,depois dizem que não disseram isso e/ou foram mal interpretados, simplesmente nunca as propostas econômicas foram tão claras quanto agora,espero que o povo escolha no voto seu destino  com serenidade.

  6. é ingenuidade ou burrice

    é ingenuidade ou burrice mesmo achar que há neutrallidade na escolha economica ou política.

    armínio defende o óbvio para seus bancos de investimento e sua turma que quer de volta o neonliberalismo e o arrocho salarial.

    e maioria tem direito de defender o que achar melhor pra ela.

     não ser enganada por essa trupe de especuladores.

  7. Prezados,
    sabemos das

    Prezados,

    sabemos das diferenças entre as ideologias neoliberais e desenvolvimentista. Contudo, a maior parte da população brasileira não sabe dessa diferença que pode trazer grandes prejuízos. A população brasilera está sendo influenciada pela mídia conservadora, para não falar outra coisa. Conversamos entre a gente e sabemos de tudo o que está por trás dos nossos adversários, mas temos que divulgar para maior parte da população, pois é ela que tem o poder decisório sobre essas eleições. Poderíamos fazer um texto pontuando todas as contradições da Marina e Aécio, mas com fundamento, pontuando os trechos dos programas deles e explicando cada passagem. Postar esse texto no facebook, começcando com os que votarão em Dilma e peça para compartilhar, asim poderemos atingir um maior número de pessoas. Essa é uma sugestão. Grande abraço!!!! 

     

  8. esqueci de dizer algo que

    esqueci de dizer algo que receava dizer por medo de não ser aceito.

    se um proagrama econmico desses fosse p´roposrto  à sociedade por um partido de esquerda o própiro mainstream mandaria a força policial prender os “malucos”

  9. Todos ralando e ralando muito e esperando o bolo crescer

    Se Dilma não se reeleger, Arminio Naufraga será o próximo ministro da Fazenda, isso por imposição de Soros e CIA, ganhe Aécio ou Marina. Tenho a impressão de que o povo, em especial a classe mérdia, tá achando chique demais da conta retornar ao neoliberalismo, e sabem que se trata de um movmento em direção ao abismo, mas parece que estão com saudade da época da pindaíba, todos ralando e ralando muito e esperando o bolo crescer para ser dividido, vai entender.

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