Freud e o bem-estar da não civilização brasileira, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Em seu consagrado estudo sobre o mal-estar da civilização, Freud chegou à conclusão de que:

“…o desenvolvimento individual nos aparece como um produto da interferência de duas tendências: a aspiração à felicidade, que habitualmente chamamos de ‘egoísta’, e a aspiração à união com outros na comunidade, que denominamos ‘altruísta’. As duas designações não vão muito além da superfície. No desenvolvimento individual, como foi dito, a ênfase cai geralmente na aspiração egoísta ou à felicidade; a outra, que pode ser chamada ‘cultural’, contenta-se, via de regra com o papel restritivo. É diferente no processo cultural. Nele o principal é, de longe, a meta de criar uma unidade a partir dos indivíduos humanos; a meta, da felicidade ainda existe, mas é impelida para segundo plano; quase parede que a criação de uma grande comunidade humana teria êxito maior se não fosse preciso preocupar-se com a felicidade do indivíduo. O processo de desenvolvimento individual pode então ter traços especiais, que não se repetem no processo cultural humano; é apenas na medida em que o primeiro desses processos tem por meta a incorporação na comunidade que ele necessariamente coincide com o segundo.” (O mal-estar da civilização, Sigmund Freud, Penguin & Companhia das Letras, São Paulo, 2011, p. 87/88)

Um pouco antes de chegar à esta conclusão disse o pai da psicanálise que:

“…o preço do progresso cultural é a perda da felicidade pelo acréscimo do sentimento de culpa.” (O mal-estar da civilização, Sigmund Freud, Penguin & Companhia das Letras, São Paulo, 2011, p. 81)

Atolados em graves denúncias de corrupção, os principais líderes nacionais do PSDB (Aécio Neves, Fernando Henrique Cardoso, Aloysio Nunes e José Serra) seguem tentando derrubar o governo Dilma Rousseff. Com ajuda da grande imprensa, que mostra a corrupção do PT e minimiza ou esconde a do PSDB, os tucanos agem como se fossem árbitros honestos e legítimos da conduta alheia. Eles são incapazes de demonstrar qualquer sentimento de culpa pela corrupção que praticaram, mas querem que os petistas sejam considerados culpados por atos semelhantes.

A felicidade dos tucanos, portanto, não advém da consciência limpa, mas, paradoxalmente, da consciência culpada. Em razão da proteção que recebem da imprensa, eles são levados a acreditar que tudo o que eles fazem é correto, que a culpa deles por se corromper e corromper a sociedade brasileira é inexistente ou, no mínimo, justificada quer em razão da classe social que representam ou de privilégios sócio-econômicos herdados. Como a corrupção do PSDB é escondida ou minimizada pela imprensa e raramente perseguida com ferocidade pelo Poder Judiciário, os tucanos não pagam qualquer preço pelo progresso cultural. De fato, o próprio progresso cultural vai sendo assim interrompido. A mídia pretende congelar a sociedade brasileira. E para fazer isto precisa expulsar do poder aqueles que, segundo os barões da mídia e seus aliados tucanos, tem apenas um direito natural: o de ser subalternos.

Neste contexto é impossível não perceber que no Brasil o desenvolvimento pessoal e o cultural ocorrem de maneira absolutamente oposta ao descrito no livro O mal-estar da civilização brasileira é diferente daquele percebido por Freud.

A aspiração da felicidade individual de líderes tucanos como Aécio Neves, Fernando Henrique Cardoso, Aloysio Nunes e José Serra e de donos de empresa de comunicação como Frias, Civita, Marinho e Saad  não está em conflito com o altruísmo. O egoísmo é por eles considerado a essência da construção da sociedade e do Estado brasileiro com a exclusão da pretensão da inclusão social e da construção da igualdade de oportunidades preconizadas pelo PT. Isto explica a duplicidade moral que os tucanos e jornalistas empregam ao julgar suas próprias condutas e as condutas dos outros, dos indesejados (índios e negros fugidos durante a Colônia e Império; pobres rebeldes, anarquistas e comunistas nas Repúblicas que precederam a CF/88 e os petistas na fase republicana atual).

Os tucanos dizem que não são racistas, mas atacam as cotas raciais. Afirmam que respeitam a soberania popular, mas rejeitam o resultado da eleição que perderam. Incorporam à sua retórica a defesa da CF/88, mas não querem que vários de seus princípiosentrem em vigor (regulação da mídia, financiamento público de campanha, tributação de fortunas, assistência médica gratuita para os miseráveis, educação universitária gratuita, etc…). Quando não estão tentando sabotar os programas sociais do governo alegando ter compromisso com a “social democracia”, os tucanos adotam como sua a agenda da extrema direita (pena de morte, redução da maioridade penal, etc…).

O bem-estar da civilização brasileira só pode, portanto, decorrer do respeito ao desejo absoluto daqueles que se consideram “donos exclusivos do poder”. O egoísmo deles deve ser, segundo eles mesmos, o único fundamento da vida pública. O princípio egoísta deve orientar todas as ações de um Estado que foi construído com a finalidade de excluir os “outros” dos benefícios da civilização. Toda e qualquer realização altruísta deve, portanto, ser rejeitada, banida e criminalizada. Por isto os tucanos corruptos e os jornalistas corrompidos justificam a violência policial desde que a mesma ocorra na periferia, legitimam a perseguição judiciária dos corruptos desde que eles sejam petistas e esconde e/ou inocenta a corrupção eleitoral praticada pelos tucanos.

A exclusão é a única meta social dos barões da mídia porque a proteção dos egoístas e do seu princípio de poder é o único programa político dos tucanos. No limite, o altruismo político, econômico e social, que sempre foi fervorosamente combatido pela imprensa e demonizado pelas tradicionais lideranças políticas brasileiras, quase sempre acarretará um golpe de estado, o exílio forçado ou a eliminação física daquele que ousar governar o país para todos, ou pior, para os “outros” que sempre foram excluídos (índios e negros fugidos durante a Colônia e Império; pobres rebeldes, anarquistas e comunistas nas Repúblicas que precederam a CF/88 e os petistas na fase republicana atual).

É impossível, portanto, compreender o Brasil empregando a teoria de Sigmund Freud. A psicanálise do nosso país só pode ser feita se colocarmos Freud de cabeça para baixo. O Brasil nasceu de ponta-cabeça e há aqueles que querem que o Brasil não deixe de ser como sempre foi. 

Fábio de Oliveira Ribeiro

7 Comentários

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  1. É bom

    Causa conforto usar ferramentas externas como a psicanalise para compreeender a situação atual. Interessante como pessoas que não acessam as informações da midia que como nós sabemos tenta manipulalas mas intuem que o povo esta percebendo essa contradição do PSDB.

    É uma especie de “não passaram nós passarinhos”

  2. O que diria Freud do PT de

    O que diria Freud do PT de 1980 com o de hoje?

       Quase toda ”explicação” dele se baseia em sexo.

       Então seria um coito promissor mas que terminou sem nenhum dos parceiros gozarem?

       Ou foi só uma expectativa que brocha por causas naturais?

        Não existe tesão sem espectativa. 

      E a expectativa é estressante.

        E aí brocha.

  3. ser tucano já era…

    se padecem de algo, só pode de falta de inteligência

    até seus instintos já foram pro lixo da História. Hoje são os corujas da política

    vigilantes na escuridão e cegos na luz, tudo a ver com falta de inteligência ou com acreditar que representa a classe dominante, mas que na realidade é dominado por ela, como cão dependente e obediente

  4. Excelente análise, Fábio.
    Excelente análise, Fábio. Sobre FHC, digo que, além de outras imperfeições morais, seu defeito maior e’ a total falta de caráter. Afirmar que seu candidato perdeu as eleições por causa dos grotões do país mostra o quão desqualificado o sociólogo se tornou. Fosse um economista, afirmar isso já seria escândalo. Vindo tal absurdo de um sociólogo, causa estranheza e preocupação, pois estaremos falando de um traíra feroz num tronco podre. Aliás, a traíra, quando está caçando, fica de ponta cabeça para enganar suas presas. Passam as águas. Passa o tempo. E a História mostrará FHC na escuridão das águas profundas de onde jamais saiu. Gabava-se de ser protetor da democracia até o dia em que se insurgiu contra o resultado de uma eleição livre e democrática, lançando o país num covil de gente ignorante e odiosa. E ele pensa que ignorantes são os capiaus dos grotões. Ele não conhece o próprio povo ao qual governou.

    “Bento Porfírio examina a chumbada, isca o anzolão de dourado, liberta a linha e dá de vara, açoitando a água com violência, “p’ra chamar a diabada desses peixes!”… Faço o mesmo, com o anzol pequeno, e Bento fica com um meio-riso, me espiando de esconso. Já sei: aqui eu não pesco e’ sobra nenhuma; as piabas não virão, porque, neste recôncavo escuro, sem correnteza, deve morar, numa loca, debaixo do tronco podre, uma traíra feroz. Como bom capiau, Bento Porfírio acha que ainda e’ cedo para me avisar. Gua:rda o pulo-de-gato. Mas nao me importo. As linhas se estiram, levadas. Passam águas. Passa o tempo.
    (João Guimarães Rosa, Sagarana)

  5. *

    Mal estar da sociedade  é vermos nos dias de hoje,  uma múmia como esse fhc, tentando aplicar os ensinamentos de Maquiavel contra todos os avanços  das modernidade, e conseguindo   incluir nesse movimento golpista , sujeitos tão orgulhosos, arcaicos e burros como ele, nessa cruzada da rumo à canalhice.

    Não tardarão a sentir os efeitos da terceira Lei de Newton: a reação da sociedade que eventualmente se deixar enganar, ou que, corrompida, se sentir traída.

    Vai ser gratificante assistir ao lacramento do sarcófago da múmia, junto ao lacramento do túmulo com seus voluntários e burros, escravos dentro! 

     

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