Combate à homofobia deve ir para o STF

A Constituição diz que não deve haver discriminação. Em função disso se legislou a 7716/89 meses após. Depois, em 1994, além de cor e raça se incluiu religião e origem geográfica no texto.

Aí viu-se que os crimes de ódio se dirigiram a LGBTs. Então, congressistas do PT (Iara Bernardi, Fátima Cleide) propuseram a inclusão de orientação sexual e identidade de gênero no texto. Beleza, ganharam votos por isso!

O projeto é aprovado sem dificuldades na Câmara, mas foi engavetado em nov./2009, quando estava para ser aprovado no Senado, supõe-se que por três partidos (PR, PRB, PSC) condicionarem seus tempos de TV a isso… 

Um horror, não? Algo estimulado pela Constituição, com projeto de partido “progressista”, é engavetado pela falta de coragem do mesmo partido de ir às eleições com programas e projetos mas sem três minutinhos de TV. Ok… Com direito a fotos comemorando as alianças firmadas em maio/2010.

Mas Marta Suplicy ganhou votos em 2010 prometendo reverter o vexame. E cumpriu o prometido, reencaminhou o projeto.

O Datasenado fez pesquisas de opinião pública mostrando a popularidade do projeto: 70% de aprovação em 2010, 77% em 2012. Ou seja, os LGBTs fizeram sua lição de casa: conscientizaram a população! E votaram nos políticos comprometidos!

Mais ou menos o mesmo que aconteceu em 2009 é o que parece que aconteceu em 13/12/2013, quando a Ministra Salvatti pede para os senadores do PT retirarem o projeto de votação.Para não perder em 2014 os minutos de TV?

E os militantes na internet dizem que isso é necessário para “combater a miséria”? Não convence ninguém, claro.

O que resta desse furdunço é o que aconteceu: o PPS está movendo uma Adin. Agora o assunto irá para o STF, que será obrigado a decidir pelo óbvio: é uma omissão do Estado e do Congresso não colocar orientação sexual na lei 7716/89. Afinal, é mais que evidente que há crimes de ódio crescendo em taxas de dois dígitos desde que o Senado engavetou o assunto pela primeira vez….

E aí não é o Congresso que está sendo inoperante… É pior: o Congresso está trabalhando ao contrário, está trabalhando pelo atraso, pela inconstitucionalidade! E contra a opinião pública!

Então, quando achamos que o Congresso é inativo, não necessariamente o é, é ativo mas perverso.

O resultado político existe. Em função de senadores do PT boicotarem o próprio projeto do PT há, em segmentos LGBT, muito mais indignação com o PT do que com a bancada evangélica. Afinal, fundamentalistas nunca prometeram nada a LGBTs, estão apenas sendo coerentes com suas bases. Quem mudou de ideia, quem traiu? 

O que se cobra não é o ideal, a aprovação do projeto, pois sabe-se ser isso uma incógnita (apesar da aprovação fácil na Câmara em 2009 e da maioria da população ser a favor), mas pelo menos que se acabe com esse teatro burlesco e se coloque em votação aberta em plenário!

Desse modo os eleitores saberiam quem é contra e a favor e pronto, não seriam enganados em 2014 e a representatividade e a boa política teriam vez.

O PT poderia fazer bonito, encaminhando seu próprio projeto, mas não quis. Ficou com fama de mercador de direitos humanos. Não vale acusar a bancada evangélica, pois, repetindo, o que se espera é a votação e o compromisso com a ideia, não a aprovação em si. Esta ficaria pela pressão da opinião pública. (Que às vezes não consegue as coisas, como vimos no caso do Código Florestal).

Tirando dois jornalistas da Veja (Guzzo e Azevedo), Olavo de Carvalho, Serra, Malafaia, Feliciano, bancada fundamentalista e alguns senadores do PT, quem mais é contra? Está na hora de institutos de pesquisa e mídia abordarem o tema.

Não há praticamente acadêmicos, artistas, intelectuais de renome contrários ao projeto! O manifesto a favor foi assinado tanto por Emir Sader como por Maitê Proença, para se ter uma ideia do consenso na sociedade.

Sendo assim, o PT mereceu a fama de politiqueiro que angariou com esse episódio do engavetamento do PLC 122. O que Paim e Ana Rita falam já não tem credibilidade. É um fingimento dizer que o PT é ainda ‘simpatizante’. Já foi, agora é antipatizante por interesse. O que é comprovado não apenas pelo abandono do PLC 122, mas pelo cancelamento do programa Escola sem Homofobia, pelo recolhimento das cartilhas do Min. da Saúde, pelo cancelamento de outros programas desse mesmo ministério, pela revogação da lei antihomofobia no Distrito Federal, pela ausência total de menções nos discursos de candidatos a executivo, todos comprometidos com agradar o discurso fundamentalista.

Vê-se cada vez mais pessoas declarando no facebook que não votarão mais no PT. Só que não se vê o contrário… Não há ninguém que diga: “Agora sim, em função do engavetamento do PLC 122, é que vou votar no PT”. Tiro no pé, portanto.

Para piorar o quadro, quando o CNJ normatizou o cumprimento da Constituição com o Casamento Gay, no começo de 2013, que deputado foi a plenário dizer-se contra?!?

Só que a necessidade social permanece. A demanda está aí, a mobilização também. Se o PT não quer mais ser o patrocinador desse projeto vital, há quem queira.

E o PSOL, o PV, o PPS – e também o STF – ganharam uma popularidade entre LGBTs a meu ver merecida. Afinal, foram os agentes que em vários momentos nesse percurso trabalharam a favor da vida, dos direitos e da Constituição. São os partidos com maior percentual de candidatos LGBT em seus quadros, são os partidos cujos deputados fazem consistentemente declarações em plenário por direitos (de várias naturezas.)

Além das picuinhas PT/PSDB, que envolveram oportunisticamente partidos de fundo religioso, ainda existe política de verdade no Congresso, pelo que não me sinto desesperançado. Projetos-lei não faltam, só que são boicotados pelas comissões. E, pela sistemática das mesas, as comissões são presididas pelos partidos grandes… (O PT, por exemplo, preside a CCJ, que levou avante o projeto da PEC da Teocracia, do João Campos (PSDB), e poderá encaminhar outras coisas, como o Bolsa-Estupro e PEC do Plebiscito.) 

Também é possível que junto à classe média mais instruída não agrade essa nova posição conservadora moral do PT, mas quem deseja os bônus eleitorais junto a um grupo de eleitores deve saber arcar com o ônus de desagradar a outro grupo. Gasta-se tempo à toa com sofismas, mas os fatos são esses. Há uma certa ideia de que a rejeição do PT junto ao segmento com Ensino Superior (incompleto ou não), manifestada por uma preferência por Dilma de apenas 30%, se deve a ‘classismo’. Há que se pesquisar, mas parte dessa rejeição pode ser pelo excessivo espaço dado a discursos religiosos, veja-se como correm nas redes sociais os episódios ligados à CDHM da Câmara. E, agora, a CDH do Senado.

O que sobra, enfim, aos eleitores conscientes, é tentar aumentar a bancada dos pequenos partidos que ainda se preocupam com direitos humanos, civis e difusos. Pois, se forem boicotados no Congresso, pelo menos atendem as condições legais de moverem ADIs e Adins e aí se vai para o STF.

STF esse, por sinal, que é criticado pelo julgamento da AP 470. Mas que sempre foi coerente, modernizante e evolutivo na área de direitos e constitucionalidade.

Militantes do PT não gostam que se fale de tudo isso, mas é problema deles saírem da redoma de opinião em que se colocaram. A questão pendente é STF versus PT (e indiretamente PTB, PMDB, PP, PR), mas isso é um fato circunscrito. 

A sociedade civil não rejeita, como um todo, a atuação do STF nem dos partidos que recorrem ao mesmo em função da inoperância legislativa. Muito pelo contrário.

Redação

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador