Dia Nacional do Choro é sinônimo de Pixinguinha

Em homenagem ao Dia Nacional do Choro, trago um Pixinguinha que compõe, executa arranjos, toca instrumentos, canta, fala…

Pesquisar a história do artista Pixinguinha equivale a um mergulho profundo nas raízes da Música Popular Brasileira e, ao emergir, constatar que a tradição do Choro só pode ser verdadeiramente estudada e compreendida se considerada em pelo menos duas grandes fases, ou seja, antes e depois do genial Pixinguinha. Post completo aqui.

– Documentário sobre Alfredo da Rocha Viana Filho, o Pixinguinha em 1969.

– Pixinguinha, Baden Powell e João da Baiana – “Lamento”

– “Lamento” (Pixinguinha/Vinicius de Moraes) # Ademilde Fonseca.

– “Yao” (Pixinguinha) # Benedito Lacerda e seu Regional e Pixinguinha (voz).

– “Carinhoso” (Pixinguinha/João de Barro) # Pixinguinha e Orquestra.

Laura Macedo

21 Comentários

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    1. Viva o Choro e Pixinguinha!

      Amigo Luciano,

      Chegando agora e saindo daqui a pouco para as comemorações do Dia Nacional do Choro.

      Que belo Multirão do Chorinho!! Parabéns ao Nassif / GGN pelo destaque da data e os colaboradores pelos posts. Viva o Choro e o eterno Pixinguinha.

      Grata pelos vídeos.

      Abraços da amiga de sempre,

      Laura

  1. Comparar com Bach e Mozart é pouco!

    Pixinguinha fez muito mais do que se imagina pelo música brasileira, que é a autêntica alma do Brasil.

    Numa época em que a indústria cultural e as grandes empresas de mídia não tinham tanta força era necessário aos compositores brasileiros inventar tudo. Desde as formas de composição musical, até instrumentação e arranjos, todos sempre guiados pela poesia que sempre conduziu a música popular brasileira.

    Por força de seu talento e da falta de profissionais na época Pixinguinha, que era flautista, foi elevado a condição de compositor, arranjador e até maestro. E é aí que a genialidade do gran de Pixinguinha se revela! Como ele não sabia fazer arranjos ele teve de inventar uma forma de fazer arranjos. Criou então toda uma nova linguagem de arranjo e contraponto (eram famosos até na época os contrapontos do mestre) genuína, brasileira, envolvida com a poesia das letras e coerente com a sonoridade do ambiente brasileiro. Desde então não houve um mestre sequer que não bebeu na fonte de Pixinguinha, e todos tem orgulho de revelar isso: Altamiro Carrilho, Tom Jobim, Rogério Duprat, Egberto gismonti, a lista é interminável, e inclui até o humilde pianista que escreve.

    Por último conto a história da obra de extremo virtuosismo que é “Um a Zero”, cujo solo de flauta só o mestre Pixinguinha consguia executar por um longo tempo, até surgirem Altamiro Carrilho e outros que por seu esforço conseguem executar esta música.

    1. Assino embaixo

      Fernando, excelente comentário. Assino embaixo.

      Só faltou uma coisa: um vídeo seu interpretando o eterno Pixinguinha rsrsrrsrs.

      Abraços.

  2. Não fica chateado não,

    Não fica chateado não, Nassif, mas confesso que estou meio enjoado de choro. Testemunhei o renascimento da Lapa boêmia e musical a apartir do fim dos anos 90. Ia para as noites lapianas dia sim dia também (ah a juventude). Foram quase vinte anos de roda de samba e choro na veia todo dia.

    Acho que devido a hortodoxia radical da maioria dos músicos, acabei enjoando. Mas não de Pixinguinha! Nunca me canso. Esse transcende ao estilo musical. Um gênio absoluto. Comparável aos jazzistas do nível de Charlie Parker, Coltrane, Miles, Duke Ellington, enfim todos os grandes. 

  3. Fica calmo que aparece

    Os Oito Batutas, grupo que Pixinguinha integrava como flautista, obteve muito êxito no choro.

    Pixinga (esquerda) e os outros batutas

    A temporada do conjunto no Cinema Palais em 1919, destacou-se entre os grandes êxitos da carreira do grupo.

    Em depoimento ao MIS, Pixinguinha contou que “tinha uma turma grande que nem entrava para assistir ao filme”.

    As pessoas passaram a frequentar a sala de espera do cinema apenas para ouvir os chorinhos.

    O prestígio dos músicos dos Oito Batutas no Palais aumentou e, no mesmo ano, a Odeon gravou seis músicas com o conjunto.

    Entre elas, ‘Fica calmo que aparece’, de Donga.

    [video:http://youtu.be/7SbZjhzTMqY%5D

        1. O CARRANCISMO

           O BÁRBARO E AS BARBARIDADES

          Até a partida do grupo para Paris no dia 29/01/1922, a bordo do navio Massília, não encontrei nenhuma notícia que se colocasse contra a viagem, apenas o entusiasmo prevaleceu.

          É a partir do dia 01/02/1922, portanto três dias após zarparem, que saem notícias reprovando a viagem, com teor agressivo e racista (notas essas que geralmente

          arranjam as narrativas sobre o evento, compondo a idéia de um debate “acalorado” na imprensa). É curioso notar que estas notícias partem do interior do país, sobretudo de Recife (PE), de onde duas notas chamam a atenção. A primeira do Diário de Pernambuco162, pelo cronista A. Fernandes:

           

          De uns e de outros…

           

          Há pouco eu lia no Temps um artigo de um médico francês que esteve no Brasil, e todo ele era uma verdadeira apologia da cozinha nacional. Imaginem que o homem tão emocionado ficou com a nossa arte culinária que a propunha ao país de Pantagruel e de Brillat como tendo muita coisa digna de ser imitada. E exaltava com o senso apurado de um perfeito gastrônomo o excelente almoço „jeca-tatu‟ que o Dr. Baeta Neves lhe oferecera.

          Confesso que me senti orgulhoso do íntimo de minha brasilidade por ver assim louvados e admirados os pratos indígenas, que o „snobismo‟ cosmopolita vai pouco a pouco substituindo pela comida européia. Pois se um jantar qualquer, com ou sem solenidade, traz até o cardápio redigido em francês, como se o velho idioma de Camões não fosse digno de ser usado em ocasiões brilhantes!

          O sucesso do Brasil na Europa – e Paris continua a ser para muitos efeitos a Europa – não ficou, porém, adstrito a assuntos culinários. O triunfo parece muito mais considerável e abrange também a arte pura. Não bastou que o Duque, trocando heroicamente a sua profissão de dentista pela de dançarino, lançasse nos salões parisienses o „maxixe‟ brasileiro que, noutros tempos de feroz carrancismo, as „sinhás-moças‟ não ousavam dançar, sob os olhos vigilantes do papá e da mamã.

          Era preciso que a Cidade Luz, sôfrega de espetáculos inéditos, fatigada do Shimmy, da dança do urso, do dadaísmo, do expressionismo, da arte negra, culminando com a atribuição do prêmio Goncourt ao romance de René Maran – ouvisse e admirasse como a mais alta expressão da música brasileira a famosa troupe de os Oito Batutas! Paris vai ter, entre todas as capitais da Europa, a honra insigne de aplaudi-los e, por um momento, esses heróis serão o expoente de nossa raça.

          O caso é esse, senhores. Os Oito Batutas vão à pátria de Saint-Säens fazer mais uma vez o Velho Mundo curvar-se ante o Brasil. Não sei se a cousa é para rir ou para chorar. Seja como for, o boulevard vai se ocupar de nós. Não do Brasil de Arthur Napoleão, de Oswaldo Cruz, de Ruy Barboza, de Oliveira Lima, não do Brasil expoente, do Brasil de elite, mas do Brasil pernóstico, negroide e ridículo e de que la chanson oportunamente tomará conta…

          (Diário de Pernambuco, RE, 1/02/1922. In: Silva e Oliveira Filho, 1979: 203)

           

          No mesmo dia, também em Recife, no Jornal do Comércio, por autor que se identifica apenas por S., sai a segunda nota:

            

          MEU DIÁRIO

           

          O Sr. Benjamin Costallat, que é um dos nossos mais finos observadores, estava o ano passado em Paris, quando a sua confreira patrícia, a Sra. Regina Regis, lá residente, fez representar num teatro qualquer uma peça „genuinamente brasileira‟ por ela assim inculcada ao público e, como tal, por este vivamente aplaudida.

          Nessa assistência, contava-se a flor de nossa colônia na cidade luz. E o cronista não pôde deixar de manifestar a sua indignação em correspondência para um jornal do Rio diante de um negroide obsceno das bananeiras e dos sambas que a Sra. Regis se lembrara de impingir como as únicas coisas típicas de sua pátria à frivolidade boulevardière.

          Eu recordei-me imediatamente do protesto de Costallat ao ler um dia destes o telegrama que o dançarino Duque embarcara com destino à capital francesa levando em sua companhia a troupe dos Oito Batutas. Esses „artistas‟ já estiveram aqui exibindo-se no Teatro Moderno. São oito, aliás, nove desempenados pardavascos, que tocam viola, pandeiro e outros instrumentos rudimentares, acompanhando uns aos outros em cantigas do horrível gênero Catulo Cearense e dançando com exagero as cores da nossa Terpsicore bárbara.

          Pois bem! É essa gente que Luiz Duque, o famoso bailarino do Luna Park, um dos ilustres reveladores de „La Mattchiche‟ ao velho mundo, vai fazer exibir no seu cassino, onde passa cotidianamente a gama de basblenismo e do rastacuerismo internacional. Os Oito Batutas vão ser, dentro em pouco, o número „suco‟ do Luna e, diante deles, o parisiense blasé se espantará, excitando a sua perdida sensualidade diante das sortes daqueles mulatos audazes que pretendem representar o Brasil.

          E não haver uma polícia inexorável que legalmente os fisgasse pelo cós e os retirasse de bordo com manopla rija, impedindo-lhes a partida no liner da Mala Real! Impunemente, porém, os Oito Batutas lá vão rumo de Paris mais o Duque, que tem olho fino, mais fino mesmo que os pés e sabe como os treinar para que eles se mostrem de verdade uns cotubas no remelexo, nas cantilenas estropeadas de Catulo, na música lúbrica dos choros. Para consagrá-los e desmoralizarem cada vez mais o seu país, lá estão à espera com os seus lugares reservados, os mesmíssimos brasileiros que aplaudiram a peça „nacionalista‟ da sra. Regis.

          E depois ainda nos queixamos quando chega por aqui um maroto estrangeiro que, de volta a penates, se dá a divertida tarefa de contar das serpentes e da pretalhada que viu no Brasil.

          (Jornal do Commercio de Recife, RE, 1/02/1922. In: Silva e Oliveira Filho, 1979: 204).

        2. Vídeo-raridade do ‘músico sem qualificação’

          A Música Brasileira Era Pixinguinha

          Um homenagem apropriada para a importância deste grande homem. 

          ‘Pixinguinha e a Velha Guarda do Samba’ (2007), curta dirigido por Ricardo Dias e Thomaz Farkas

          Em abril de 1954, nos festejos do IV Centenário de São Paulo, Thomaz Farkas filmou uma apresentação de Pixinguinha com a Velha Guarda do samba. O filme recupera esse material, perdido por 50 anos.

          [video:http://youtu.be/m1uU8I0g4oI%5D

          Filme Hors-Concours no Festival do Rio 2007.

          Com referências do samba, Pixinguinha dedicou-se ao choro, sem nunca comprometer os seus padrões de excelência. Foi compositor, arranjador, instrumentista virtuoso, maestro, líder da banda e professor; Pixinguinha era a própria  Música Brasileira.

          Em 13 de maio de 1888 – um quarto de século após a escravidão ter sido abolida nos Estados Unidos – a Princesa Isabel, na ausência do seu pai, assinou a ‘Lei Áurea’, libertando os escravos no Brasil sem nenhuma indenização para os seus proprietários. Um negro brasileiro nascido apenas uma década depois, Alfredo da Rocha Vianna Jr. (Pixinguinha), estava destinado a sofrer discriminação tanto na sua vida privada e profissional, uma vida que foi marcada pelo destaque com a sua música e o seu extremo carinho pessoal.

          Conhecido principalmente como um flautista virtuoso, Pixinguinha, na realidade,  gravou mais com o sax que a flauta. Ele optou pelo sax tenor, quando no início de 1920, percebeu que precisava de um som mais poderoso e maior sonoridade para as apresentações em salas maiores, como Paris, que era muito maior do que os locais onde os Oito Batutas tocavam no Rio de Janeiro. 

          O grupo foi levado para a Europa por Arnaldo Guinle, cuja família era dona do grande fortuna e também eram envolvidos com a música e o show business, também proprietários do Ggrande Hotel em Copacabana. 

          Foi nesta viagem que Pixinguinha adquiriu um sax tenor Selmer de prata e começou a desenvolver um som que lembrava o de Johnny Griffin.

          Antigamente, ‘talkies’, pianistas e, por vezes, pequenas orquestras eram contratadas pelas salas de cinema para acompanhar a ação na tela. O grupo dos Oito Batutas começou desta forma: Pixinguinha na flauta, Ernesto dos Santos (Donga) e Raul Palmieri no violão , Otávio Viana (China) no violão e voz, Nélson dos Santos Alves no cavaquinho, Luís Pinto da Silva na bandola e reco-reco, Jacob Palmieri no pandeiro e José Alves Lima no bandolim e ganzá. 

          Os Batutas foi o primeiro conjunto a empregar (para além da tradicional flauta, violão e cavaquinho) instrumentos como o reco-reco, o pandeiro e o ganzá. O seu repertório incluia maxixes, lundus, modinhas, batuques e cateretês.

          O Batutas, no entanto, não eram autorizados a tocar no palco – eles tocaram no foyer do teatro. O palco era apenas para músicos brancos de prestígio. A sua música, no entanto, falava ao espírito brasileiro. Havia ainda aqueles que compravam bilhetes apenas para ouvir Pixinguinha e não prestavam atenção aos filmes exibidos. Um de seus maiores fãs era o compositor Ernesto Nazaré, que na época era o pianista no cinema Odeon.

          Com o tempo, Pixinguinha tornou-se um embaixador musical. Quando o rei e a rainha da Bélgica visitaram o Brasil em 1920, os Oito Batutas fizeram um show e passaram a encantar a aristocracia europeia, quando, em 1922, Arnaldo Guinle organizou a turnê europeia do grupo. Assim que a notícia da turnê europeia circulou, jornais do Rio e até mesmo no Nordeste do Brasil publicaram artigos de escritores que ficaram indignados com a ideia de ‘negros arrogantes e ridículos’ representando o Brasil. 

          Entre aqueles que se queixaram, estavam Gilberto Amado, escritor e político na Câmara dos Deputados e Hermes Fontes, um hsujeito que tinha sido amigo do grupo, mas que se juntou às críticas mesquinhas e preconceituosas que exibiam abertamente uma posição racista. Os artigos detonavam a música do Batutas que era classificada por eles (os pulhas) como muito primitiva, muito bárbara e muito negativa para representar o Brasil n o exterior.

          Com todas as probabilidades de insucesso voltadas contra eles, os Oito Batutas ‘arrebentaram’ durante a excursão à Europa e ‘incendiaram’ París. 

          Eles mostraram o melhor da música instrumental brasileira para francos e gauleses.  Intelectuais e apreciadores de boa música frequentavam os seus shows e pediam para serem apresentados aos craques brasileiros. 

          Eles receberam críticas fenomenais e permaneceram em evidência em Paris por tanto tempo que não concluíram o itinerário europeu previsto. No caminho de volta para o Brasil, eles pararam em Buenos Aires, onde gravaram para a RCA Victor da Argentina e receberam a poética homenagem que o jornal La Razón publicou.

           Aqui estão as primeiras e últimas estrofes:

          Negro, tu tienes dos alas 
          y por volando los nidos 
          recogiste los sonidos 
          en caprichosas Escalas …

          Vuela … Condor tropical 
          a tu bosque, a tus montañas 
          y devoras esas entrañas 
          flauta colosal con tu

          (Homem negro, você tem duas asas 
          E voa através dos ninhos 
          Você coleta os sons 
          Das escalas caprichosas

          Voa … Condor tropical 
          Para o seu bosque, suas montanhas 
          Você devora nossas entranhas 
          Com sua flauta colossal.)

          Em 1940, o maestro Leopold Stokowski (1882-1977) pediu a Villa-Lobos para selecionar alguns músicos para uma série de gravações que apresentassem o melhor da música popular brasileira para um congresso pan-americano de folclore. Entre os músicos que Villa-Lobos contratou, estava um homem que brilhava com suas próprias composições de frevos, choros e maracatus – Pixinguinha. 

          Dois álbuns da Columbia, lançados há alguns anos, documentaram estas performances históricas.

          Presumivelmente por causa de dificuldades financeiras na década de 40, Pixinguinha foi levado a se juntar ao grupo de Benedito Lacerda, com o compromisso que ele  tocaria sax tenor. Lacerda era um homem bondoso, que tinha relações amigáveis ​​com todos os músicos em uma banda que trabalhou para a RCA Victor. Por ter sido um flautista soberb, juntar-se ao grupo de Lacerda no sax poderia ter sido interpretado como uma imposição a Pixinguinha. Verdade ou não, ambos os lados adquiriram resultados brilhantes com a música resultante. 

          Com Pixinguinha a bordo eles atingiram um auge de desempenho que até então não tinha sido alcançado na música popular brasileira. Pixinguinha fez mais do que simplesmente assumir um papel no grupo: ele improvisou excelente contraponto do se sax tenor sob as notas de flauta solo de Benedito Lacerda e, juntos, eles compuseram obras inovadoras como ‘Ingênuo’, ‘Um a zero’ e ‘Segura ele’.

          Dois fatores contribuíram para a natureza duradoura da música de Pixinguinha. Em primeiro lugar, a sua música surgiu a partir de raízes portuguesas e africanas: do lundu, do choro, do samba de roda e do maxixe . Através destes ritmos Pixinguinha teceu a sua improvisação. Em segundo lugar, Pixinguinha tinha sido exposto e empregava tendências europeias em instrumentação e harmonia. Ele introduziu instrumentação para a dança salão no Brasil, numa época em que o movimento modernista, que tinha começado em São Paulo em 1922 e se espalhou por todo o Brasil, criou uma comoção nas artes que intelectualmente agrediu os velhos padrões no teatro, literatura, poesia, e, especialmente, na música, que já não tinha de ser baseada no modelo Português continental.

          As primeiras gravações de música de Pixinguinha, ‘Sofres Porque Queres’  e ‘Rosa’, ambas de 1917, demonstram a natureza avançada do seu estilo de arranjos e composição. O renomado compositor Radamés Gnattali o chamou de gênio. Villa-Lobos se referiu a ele como ‘um músico sem qualificação’. E, mais recentemente, Mauro Senise disse que Pixinguinha era um gênio em harmonia cujas obras não perde nada com o passar do tempo. Musicólogos hoje apontam Pixinguinha como o ponto de partida para arranjadores orquestrais brasileiros. Suas obras proporcionam ao aprendiz uma análise transparente dos princípios da harmonia brasileira, contraponto, ritmo e nuances regionais.

          Quando ‘Carinhoso’ foi gravado em 1928, criou-se algumas reações intrigantes. O choro apropriadamente intitulado tinha uma linha melódica sedutora, mas uma harmonia muito incomum para a época. Alguns críticos o classificaram como ‘americanizado’, porque acreditavam que ele tinha algo a ver com o jazz americano. ‘Carinhoso’ não era tão americanizado como as pessoas pensavam, embora tenha representado uma mudança na estrutura do choro . Com ‘Carinhoso’, Pixinguinha abandonou a forma tradicional de choro  de três partes que ele adotou em suas primeiras obras-primas ‘Um a Zero’, ‘Lamentos’, e acima de tudo, ‘Ingênuo’ e deu-lhe uma estrutura aparentemente simples – uma introdução e duas partes. Não obstante a sua estrutura simples, ele era harmonicamente sofisticado. Quase dez anos depois, quando o choro foi gravado novamente por Orlando Silva com letra de João de Barro, mas com a mesma estrutura harmônica preservada, o mundo estava pronto…

          As orquestrações de Pixinguinha foram o elemento vital para as gravações da RCA Victor por Francisco Alves, Mário Reis, Sílvio Caldas, Orlando Silva e Carmen Miranda, durante a década de 30. Ele foi um dos dois gigantes durante a Era de Ouro da música brasileira (o outro é Radamés Gnattali).

          Muitos fatos vieram à tona reconhecendo que Pixinguinha estava à frente de seu tempo. Curiosamente, em 1974, no auge da redescoberta de Scott Joplin, Gunther Schuller transcreveu a partituras do piano de Joplin para trombone, trompete, clarinete e tuba. Schuller utilizou os instrumentos tradicionais similares aos de pequenos grupos de New Orleans e respeitou os estilísticos ritmos sincopados do ragtime. Mas os seus arranjos tinham uma qualidade de música de câmara. Na medida em que Schuller nunca tinha ouvido gravações de Pixinguinha, era ainda maior a probabilidade de que Pixinguinha não teria sabido nada sobre Joplin (morto, sepultado e esquecido desde 1914), os resultados das transcrições de Schuller foram surpreendentes. O timbre orquestral e a vocalização foram idênticas às de Pixinguinha anteriores aos anos 20.

          As composições de Pixinguinha ainda merecem um estudo mais extenso. ‘Carinhoso’, ‘Lamento’, bem como ‘Rosa’ evoluíram e foram surpreendentemente melhoradas com a adição de intrincadas melodias. ‘Página de Dor’, escrita por Pixinguinha e Cândido das Neves, em um guardanapo sobre a mesa de um bar barato, é um exemplo proeminente.

          Uma foto bem conhecida mostrando Pixinguinha em casa, de pijama na sua cadeira de balanço, transmite uma imagem de um homem caseiro. Referindo-se a que a imagem evoca, Henrique Cazes (um extraordinário tocador de cavaquinho  e um dos principais  responsáveis ​​pela redescoberta de muitas das composições orquestrais de Pixinguinha) disse que é hora de tirar o pijama do mago e vesti-lo com o figurino dos grandes maestros, porque a posteridade não foi totalmente justa ao grande Pixinguinha.

          A fotografia traz à mente o grande músico de jazz norte-americano, Louis Armstrong (Satchmo). Ambos tinham imagens despretensiosas que constantemente colocavam as suas composições e o toque magistral em segundo plano. Biógrafos de Satchmo têm tentado, por anos, modificar a indevida a imagem dele retratada como, simplesmente, um folclórico palhaço. Armstrong e Pixinguinha revelaram tanto talento precoce em instrumentos de sopro, que inovaram a música de seu tempo, tendo como fachada pequenos conjuntos e sugestivos apelidos.

          O lado despretensioso de Alfredo da Rocha Vianna Jr. começa com um apelido que algumas pessoas indevidamente atribuem à palavra ‘pizindim’, que se traduziria em ‘bom menino’, em um dialeto africano. Outros subscrevem a teoria de que o seu apelido decorre de ‘bexiga’, oriunda da luta do garoto Pixinguinha com a varíola que deixou marcas (coloquialmente chamadas de bexigas ) no seu rosto e no corpo, resultando no apelido de ‘bexiguinha’. A imagem também decorre dos estreitamento dos laços de amizade que ele inspirava na sua família e entre amigos. 

          Em 1972, sua esposa, Bete, entrou no hospital sofrendo com um distúrbio digestivo. Pixinguinha, ao mesmo tempo, sofreu o quarto ataque cardíaco e também foi hospitalizado. De uma forma que demonstrava todo o amor e grandiosidada da sua alma, todos os dias Pixinguinha pedia ao seu filho para trazer rosas ao hospital. Pixinguinha vestia-se, levava as rosas para Bete e fingia que estava lá para apenas para visitá-la. Ela nunca soube que ele tinha tido o seu quarto ataque cardíaco. Bete foi operada, mas nunca deixou o hospital. Com a morte da esposa, Pixinguinha desabou emocionalmente e perdeu o interesse pela vida.

          Em uma tarde quente em fevereiro de 1973, Pixinguinha estava na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, esperando a chegada do pai da sua afilhada para dar início ao batizado. Pixinguinha começou a se sentir mal e soltou o seu cinto com a esperança de aliviar o desconforto. Tornando-se angustiado com a demora e sofrendo com o calor intenso, foi levado para uma área com temperatura mais amena, na parte de trás da igreja. O ‘Santo’ fechou os olhos pela última vez e faleceu dentro daquela igreja, fazendo o céu chorar.

          Créditos:

          Este comentário é uma interpretação livre do texto publicado pelo site Brazzil.

          O vídeo – que não estava inserido inicialmente pelo autor do texto – é uma raridade que mostra o grande Pixinga ‘mexendo as cadeiras’ e dando uma reboladinha, que passava longe do remelexo e da expertise dos matreiros Donga e João da Baiana.

  4. VIVA SÃO PIXINGUINHA!

    Com o que o grande Jacob concorda plenamente.

    Palmas para o Choro – e pra quem o ama especialmente, uma certa pesquisadora.

    Beijos.

  5. ‘dinheirinho pro ônibus’

    A malandragem é de Pixinguinha

    Foto: Walter Firmo   Hermínio Bello de Carvalho:

    “Andando pelas ruas, Pixinguinha poderia até passar por um ilustre desconhecido. Mas qual o quê! Certa vez, de madrugada, chegando em casa, foi abordado pelos chamados ‘amigos do alheio’, uns sacripantas que tentaram furtar o velho. Quando o reconheceram, pediram desculpas, ‘mil desculpas, seu Pixinguinha’ – e fizeram questão de escoltá-lo até sua casa. E Pixinguinha não fez por menos: abriu as portas, ofereceu um lanche e, na saída, ainda perguntou: vocês não precisam de um dinheirinho pro ônibus, meus filhos?”. Esse era São Pixinguinha!

    Em maio de 1956, Pixinguinha recebeu uma homenagem do prefeito Negrão de Lima com uma rua com seu nome: Rua Pixinguinha, no bairro de Olaria, na cidade do Rio de Janeiro, onde morava. Fonte: Instituto Moreira Salles.

  6. Agradecimentos

    Amigo JNS,

    Grata por disponibilzar tantas informações importantes sobre o “São Pixinguinha”.

    Olha só que foto linda. O beijo “carinhoso” da Dona Beti em Pixinguinha. Ao lado deles Donga e Vó Maria.

    Abraços.

    1. Cotuba não, uai!

      Boa noite Dona Laura!

      Donga & outros criaram ‘Os Oito Cotubas’.

      Pixinga, João da Baiana e Donga

      Em um determinado momento da carreira, em Buenos Aires, esses dois monstrinhos, Donga e Pixinga, se estranharam (imagine se fosse em Males Aires) e os Oito Batutas se desintegraram.

      NELSON ALVES, mistura e manda

      Nelson Cavaquinho Cavaquinho, O instrumento do Brasil  

      Nasceu no Rio de Janeiro, em 1895. Ainda muito jovem, começou a tocar cavaquinho, integrando na década de 1910 o lendário Grupo Chiquinha Gonzaga, que acompanhava a maestrina nas gravações da Casa Edison, e o Grupo Carioca, ao lado do trombonista Candinho Silva e do violonista Tute, pai do violão de 7 cordas.

      No carnaval de 1919, Nelson foi convidado por Donga para integrar o Grupo de Caxangá, que tinha a tarefa de animar a folia na sociedade Tenentes do Diabo. Em abril, sob a liderança de Pixinguinha, alguns elementos do Caxangá (Nelson entre eles) formaram o grupo Oito Batutas, para tocar na sala de espera do cinema Palais, um dos mais elegantes da então capital da República. O conjunto em breve receberia muitos convites para excursões – o que não era muito comum na época, devido às dificuldades de comunicação e transportes. Uma das apresentações dos Batutas em Ribeirão Preto motivou um poema de Ghritta, publicado no jornal O Albor. Transcrevemos os versos em que ele cita nosso patrono:

      “Temos falado de flauta/ Temos falado de pinho/ Agora vamos contar/ Do moço do cavaquinho.// Chama-se Nelson Alves/ E tem prêmio por tocar/ Somente com cinco cordas/ Faz coisas de admirar.”

      A estada dos Batutas em Paris, em 1922, fez com que os músicos conhecessem a extraordinária efervescência cultural da capital francesa. Como resultado, alguns adotaram novos instrumentos. Nelson passou a apresentar-se com um cavaquinho-banjo (mais tarde, tocou também banjo armado em bandolim, conforme Alexandre Gonçalves Pinto em O Choro, 1936). Na viagem seguinte, à Argentina, em 1922-23, uma estranha briga entre Pixinguinha e Donga (deve ter sido a única vez na vida em que Pixinga brigou com alguém, e logo com Donga!) levou ao fim dos Oito Batutas. Quatro deles, entre os quais Donga e Nelson, retornaram ao Rio, formando os Oito Cotubas, que foi contratado a peso de ouro (100 mil-réis por dia!) para tocar no Cabaré Fênix. Mesmo com tanta grana na parada, os Cotubas não duraram muito – em pouco tempo, com Pixinguinha de volta ao Rio, ele e Donga fizeram as pazes pra sempre e isso levou ao fim do conjunto “carbono”. Nelson não retornou aos Batutas, embora também não tivesse mais qualquer rusga com Pixinguinha – tanto que formou com ele e Tute um grupo que acompanhou Francisco Alves em algumas gravações na Odeon em 1927 e 1928. Também ao lado do autor de “Carinhoso”, Nelson participou do grupo Descobrimos o Enredo e Vamos Abrir o Bico, que tocou só no carnaval de 1931. O enorme nome do grupo brincava com o segredo com que os blocos e escolas de samba na época tratavam seus temas para o carnaval seguinte.

      Embora existam referências a Nelson como integrante do Grupo da Guarda Velha, também organizado por Pixinguinha, isso é pouco provável, pois a base do conjunto utilizava alguns sopros e muita percussão, enquanto os instrumentos de corda ficavam todos a cargo de Donga, responsável por violão, cavaquinho e banjo. Mesmo tendo gravado em 1930 discos como solista (“Nem Ela, nem Eu”, na Brunswick, e “Eu Vi Você”/ “Não Tem Dúvida”, na Parlophon), Nelson começava a sair de cena neste começo dos anos 30. Não gravou mais nenhum disco e, afora as músicas citadas, só são conhecidos seu choro “Ficou Calmo” e sua polca “Serpentina”. Nelson faleceu no Rio, em 1960.”

      Fonte: http://www.brasileirinho.mus.br/arquivomistura/52-070604.html

      ***

      Não pode falar!

      Nelson Alves era também conhecido como NELSON CAVAQUINHO

      [video:http://youtu.be/ZjXh-qWOKoo%5D

      1. Ôpa, Nelson Alves não é Nelson Cavaquinho

        ôpa, os dois eram gênios, mas eram pessoas diferentes. Colocaram um texto de Nelson Alves e uma foto de Nelson Cavaquinho.

        Nelson Alves pertenceu a primeira formação dos Oito Batutas, foi a França com Pixinguinha e foi compositor de grandes choros como Mistura e Manda e Nem Ela, Nem Eu. Faleceu na década de 60, Era instrumentista, e tocava cavaquinho, dai a confusão. Já Nelson Cavaquinho, não precisa nem falar, foi um bamba da nossa música, começou sua trajetória como soldado e se tornou um dos maiores melodistas do samba e um boemio inigualável. Se chamava Nelson Antônio da Silva e faleceu em 1986. Misturaram e mandaram mal.

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