Em pequeno artigo no site do Jornal do Brasil, o jurista Celso Bandeira de Melo afirma que “os que militam nesta área [do Direito] (…) se sentem escandalizados com a forma como foi conduzido o julgamento [do chamado Mensalão pelo Supremo Tribunal Federal]”. Embora tenha evitado se manifestar reiteradamente sobre o julgamento, Bandeira de Melo, renomado no meio jurídico, deixou claro pelo menos duas vezes sua estranheza com as decisões tomadas pelo Supremo neste episódio. A última foi esta, num artigo de três parágrafos, que termina desejando que “o País não enverede para o obscurantismo”.
Em dezembro, depois de encerrado o julgamento, em um seminário sobre Direito Público em São Paulo, Bandeira de Melo afirmou que o julgamento foi “um soluço na história do Supremo Tribunal Federal”. “Entendo que foram desrespeitados alguns princípios básicos do Direito, como a necessidade de prova para condenação, e não apenas a suspeita, a presunção de culpa. Além disso, foi violado o princípio do duplo grau de jurisdição”, afirmou.
Abaixo, a íntegra do artigo de Bandeira de Melo publicado pelo Jornal do Brasil.
Ponto fora da curva
Celso Antonio Bandeira de Mello*, no Jornal do Brasil
O Ministro Luiz Roberto Barroso foi autor da mais comedida e respeitosa crítica feita ao julgamento do chamado “mensalão” – que, de resto, nem mensal foi. Com dizer que o Supremo tem tradição garantista (embora se possa discutir tal opinião) e que o julgamento em causa foi tão só um “ponto fora da curva”, quis dizer, segundo me parece, que, no caso concreto, afastou-se desta linha, o que, todavia, não significa que pretenda repetir este desvio.
Não houve até agora, nem parece que possa haver, uma crítica mais sintética, mais precisa e mais equilibrada do que esta. É pelo menos, a interpretação que dou ao comentário do Ministro. Creio, de todo modo, que ali se resumiu modelarmente o pensamento das pessoas especializadas em Direito. O que delas se escuta, na maior parte das vezes à boca pequena, porque os que militam nesta área compreensivelmente não desejam se indispor com os membros do Tribunal mais alto do País, é que se sentem escandalizados com a forma como foi conduzido o julgamento, com o desprezo em relação ao princípio da inocência até prova em contrário, com a aceitação da responsabilidade objetiva sem apoio em prova alguma e com a escandalosa desproporção das penas aplicadas em comparação com as que são impostas no País inclusive para crimes hediondos.
O fato da Grande Imprensa estar eufórica com o que ocorreu, não é de surpreender, até porque ela teve, como tudo indica, um papel preponderante no encaminhamento destes resultados. Resta agora esperar que a opinião otimista do Ministro Barroso sobre o possível caráter singular e episódico do ocorrido seja verdadeira para que o País não enverede pelo obscurantismo.
Celso Antônio Bandeira de Mello é professor emérito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
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O ponto fora da curva
Fico perplexa com a falta de coragem no meio jurídico sobre esse assunto! E fico horrorizada com o comportamento de homens e muheres de minha geração, que eu julgava corretos e progressistas…- me invade uma solidão civil e política inominável.