A importância da competição no mercado de mídia

O mercado de opinião tem características bastante semelhantes às de outros produtos de mercado.

Mais que isso, é ele quem dá voz às demandas e aspirações de grupos sociais. Quanto maior o número de grupos sociais representados, mais legítima é a democracia. E vice-versa.

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No século 20, no entanto, o modelo de grupo de mídia  acabou dispondo de tal influência sobre a opinião pública  – e, através dela, sobre governos, políticos e empresas – que eximiu-se de prestar contas de suas obrigações constitucionais.

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O direito econômico desenvolveu teorias e princípios visando conter o excesso de poder de mercado de empresas ou grupos, através de práticas  anticoncorrenciais.

Com menos concorrência, há a tendência inexorável a práticas abusivas por parte dos cartéis/monopólios, em detrimento do cidadão/consumidor.

No mercado de opinião, os malefícios são maiores ainda, porque mexem com a própria essência da democracia, desequilibrando as disputas políticas e incentivando as soluções extra-constitucionais. Foi assim, ao insuflar golpes de Estado no Brasil (como em 1964), e em várias tentativas de golpe de Estado na América Latina, ou mesmo manipulando as eleições (como na campanha contra Barack Obama) ou mesmo induzindo a linchamentos morais, como em tantos episódios.

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Em geral, a defesa dos oligopólios consiste em dividir a mídia entre a imprensa privada e a imprensa estatal: quem é contra a Globo é a favor do Granma (o jornal oficial do governo cubano) ou do Pravda (o jornal oficial do partido comunista da Rússia).

É uma esperteza retórica. A verdadeira discussão é entre um mercado de mídia oligopolizado ou um mercado de mídia concorrencial.

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Ao longo das décadas, os grupos de mídia brasileiros consolidaram um conjunto de práticas monopolistas, impedindo a entrada de novos competidores:

  • O controle da publicidade privada através do BV (bônus de veiculação), pelo qual grupos de mídia devolvem às agências de publicidade parte das verbas dos patrocinadores.
  • As centrais de mídia – especialmente na emissora líder, a Globo – valendo-se da publicidade cruzada entre diversos veículos do grupo para sufocar competidores. Tipo, quem anunciar em um jornal concorrente de O Globo, fica proibido de anunciar na TV Globo.
  • O conceito de rede de emissoras, com cada afiliada tendo vantagens competitivas insuperáveis, ante os competidores das respectivas praças, além de significar um amplo desequilíbrio das demandas e manifestações regionais.
  • O controle da publicidade pública, através de ataques e críticas a cada tentativa de mudar a composição das verbas.
  • O percentual máximo de 30% de capital estrangeiro na mídia, gerando o último cartório da economia brasileira que, desde a Constituição de 1988 passou a considerar como empresa nacional a multinacional instalada no país.
  • O controle absoluto das concessões públicas de rádio e televisão. Em todo país democrático, com economia de mercado, as concessões não sao eternas. São tratadas como bens públicos, têm prazo de validade e a obrigação, por parte do concessionário, de contrapartidas ao público. Por aqui, tornaram-se propriedade particular.
  • A parceria com os coronéis políticos donos de concessão, provocando profundos desequilíbrios nas disputas políticas estaduais.

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Daí a necessidade imperiosa de, através de uma Lei de Mídia, tirar o Brasil do anacronismo de um mercado de mídia fechada, cartelizado, impondo regras que permitam a verdadeira economia de mercado no setor.

Luis Nassif

13 Comentários

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  1. A CF é de 1988 e não de 1998

    A CF é de 1988 e não de 1998 como constou do texto. 

     

    No mais, Nassif tem razão. Vivemos num capitalismo pirata através do qual se institui nossa democracia perneta. Não há mercado de opinião, nem tampouco conflito aberto de ideais. Tudo no Brasil conspira para a ​conciliação das elites com direito a opinião publicada e para o silêncio obsequioso do povo reduzido a “respeitável publico desprovido de cidadania”. Isto explica porque tivemos independência sem respeito aos direitos dos índios e libertação de escravos, porque tivemos violência oficial desmedida contra Balaios, Cabanos, Farrapos e Canudos, porque a proclamação da Republica ocorreu com exército e sem povo, porque o Estado Novo foi um auto-golpe e porque o golpe de 1964 foi acintosamente chamado de “revolução”. 

    Cá o impulso histórico nunca foi dado pela população. A Revolução Francesa, por exemplo, foi antes de tudo uma revolução editorial. Cada clube político fazia seu jornal e tinha sua representação na Assembléia Constituinte. O intenso conflito entre os jornais nas ruas foi minando a unanimidade do poder real até o momento em o próprio Rei já não tinha mais direito a público e legitimação. Então Luiz XVI pode ser preso, condenado e decapitado. Aqui uma única “rede de TV/jornal/rádio/portal e provedor de internet/editora/produtora e distribuidora de filmes/etc”  reina soberana massacrando qualquer concorrente em potencial. 

  2. Sempre o último

    O Brasil foi o último pais a abolir a escravatura e, sem a menor sombra de dúvida, será também o último a abrir o setor de mídias, o trecho a seguir é sobre a abolição da escravatura, apenas adaptei para o momento atual, troquei a palavra “escravidão” por  oligopólio da mídia”.,neste caso os escravocratas são os latifundiários das teles, jornais, rádio, tvs…, os escravos somos todos nós..,,,,Quem sabe leiamos isso daqui a 300 anos:

    Embora muitos considerassem normal e aceitável a escravidão[oligopólio da mídia]naquela época, havia aqueles que eram contra este tipo de prática, porém eram a minoria e não tinham influência política para mudar a situação. Contudo, a escravidão [o oligopólio da mídia] permaneceu por quase 300 anos. O principal fator que manteve o sistema escravista[oligopolista da mídia] por tantos anos foi o econômico. A economia do Brasil contava quase que exclusivamente com o trabalho midiático[escravo] para realizar os trabalhos no Judiciário [nas fazendas e nas minas]. As providências para a libertação do povo escravizado pela mídia[dos escravos], de acordo com alguns políticos da época, deveriam ser tomadas lentamente.

  3. Um engano do Nassif. Na

    Um engano do Nassif. Na Constituição de 1988 havia uma definição de empresa brasileira. Achei aquilo absurdo, definir na Lei Maior o que era empresa brasileira?? Na Administração FHC achei uma besteira maior ainda. Mudaram a Constituição, alterando a definição original de empresa brasileira. Essa mudança equiparava a Coca-Cola à padaria do seu Manoel.Foi nas privatizações que percebi o por quê dessa mudança que não fazia sentido. As empresas estrangeiras com sede no Brasil, mesmo que fosse numa salinha alugada na Avenida Paulista, se equiparavam às nacionais, tanto que as privatizações foram feitas e a Telefonica, por exemplo, não tirou um tusta do bolso, de posse da TELESP, solicitou um empréstimo no BNDES com o qual pagou a compra da própria empresa. O dinheiro saiu em SEIS dias úteis. O Brasil emprestou dinheiro público para empresas estrangeiras comprarem as estatais. A taxa de juros? Era a TJLP, 3,25% ao ano, enquanto os brasileiros sofriam com juros de 12% AO MÊS nos cartões de crédito e no cheque especial. Que tecnologia tem a Espanha? A Telefonica era tão ruim que até mudou de nome, mudou para Vivo, assim como o PFL mudou para DEMOCRATAS. É a mesma técnica, a mesma gente, a mesma ideologia.

  4. “No século 20, no entanto, o

    “No século 20, no entanto, o modelo de grupo de mídia  acabou dispondo de tal influência sobre a opinião pública  – e, através dela, sobre governos, políticos e empresas – que eximiu-se de prestar contas sobre suas obrigações constitucionais.”

    É Nassif…. neste parágrafo você sintetiza o poder de chantagem que a mídia dispõe sobre qualquer um, indivíduo ou instituição. É curiosa essa serpente de sete cabeças, um poder tão grande mas ao mesmo tempo tão frágil, pois se baseia na dissimulação, numa imagem de isenção que, se for arranhada, o castelo de cartas desaba.

    Informação manipulada se combate com esclarecimento, não com um bombardeio de informação tendenciosa para o “outro grupo”. Que ganho haveria em apenas mudar o grupo favorecido utilizando os mesmos métodos? Por mais que saibamos que a isenção total é utópica, a busca pela honestidade dos argumentos é inegociável. Por isso diversificar, aumentar a concorrência, por si só é pouco. Isso não é uma briga entre torcidas, um vale tudo irracional. Como sociedade, temos que avançar e sempre questionar se estamos indo mesmo para onde queremos ou se sao os meios estão nos levando.

  5. Parabéns Nassifi
     
    Vc esta se

    Parabéns Nassifi

     

    Vc esta se tornando um ícone nesta luta contra o atrazo dos meios de comunicação que tanto mal trouxe e ainda traz ao nosso povo.

  6. Comungo com o esposado no

    Comungo com o esposado no texto. A cartelização de mídias pode até subsistir numa democracia, como subsistiu no nosso caso, mas inevitavelmente ela a desvirtua. 

    Infelizmente nesse aspecto há uma diapasão entre os novos ares que respiramos após 1988(Constituinte) em termos políticos e institucionais em contraste com o aparato midiático cartelizado herdado dos “anos de chumbo” e da anarquia em termos de concessões cujo marco foi o governo Sarney. 

     

  7. EMPRESA NACIONAL

    EMPRESA NACIONAL

    Não é verdade que “desde a Constituição de 1988 passou a considerar como empresa nacional a multinacional instalada no país”, como diz o Nasif.

    Quem deu este agrado às multinacionais foi o governo do PSDB, através de emenda à constituição de autoria do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Aprovada pelo mesmo Congresso comprado, com provas, que vendeu a reeleição de FHC. R$ 200.000 foi o preço base por cabeça de deputado para a reeleição. Quanto terá sido o valor por cabeça de parlamentar para mudar o conceito de empresa nacional da Constituição de 1988 ? 

  8. Uma democracia pra chamar de minha

    Uma democracia pra chamar de minha

     

    A ausência de competição no mercado mídia nos priva da liberdade de imprensa. Os interesses financeiros dos donos dos meios mais importantes, acabam direcionando o discurso político. Como isso influi no atual momento?

     

    É impressionante, e lamentável, observar que todos somos democráticos quando a democracia nos convém. A democracia esta presente numa sociedade na qual prevalece a vontade da maioria com respeito aos direitos das minorias. Aqui ainda é diferente.

     

    Somos diversas ilhas vivendo no mesmo espaço territorial. É agrupamento de humanos extremamente individualizados. A ausência de solidariedade e empatia como valores de convívio coletivo.

     

    Assim, para a minoria dominante, quando a democracia começa a se voltar à maioria, ao povo, é hora de mudar as regras do jogo. Quando uma ditadura começa a deixar de ser conveniente, principalmente economicamente, muda-se novamente.

     

    Somos incapazes de debater a nossa sociedade. Falta humildade, mais um valor, para aprendermos uns com os outros e construirmos algo de todos.

     

    Já comentei isso antes, mas volto a tratar aqui daquilo que considero os fatores que nos tornam uma sociedade tão belicosa no campo das ideias, o que traz consequências fáticas constantemente. São três os motivos

     

     

    1 – O ódio midiático

     

    Primeiramente, desde que Lula subiu ao poder, os principais grupos de mídia no Brasil (Globo, Abril, Folha e Estadão) vem bombardeando a população com moralismos rasos e teses apocalípticas na defesa exclusiva de seus interesses financeiros. Daí a criar cenas ridículas como a ficha falsa de Dilma na Folha, o escândalo da bolinha de papel na Globo, o “super-herói” Demóstenes Torres na Veja e as declarações “bombásticas” do Marcos Valério na primeira página do Estadão. Assim, para essa classe média, consumidora dessas mídias, o país está um caos. Desconhecem ou fazem vistas grossas à redução da desigualdade social, exemplo para o mundo, ou mesmo aos indicadores econômicos – melhores que os deixados por FHC. A coisa é tão grave que, por exemplo, numa escola particular das mais renomadas, e cara, aqui da região, crianças de oito anos interpretam Lula e Dilma numa peça satírica na qual ambos são dois patetas corruptos, para deleite dos pais.

     

     

    2 – A oposição medíocre

     

    Bem, a esse caos, junta-se a mediocridade da oposição. O país “estaria cada vez pior”, mas eles não conseguem dar uma alternativa. Não conseguem debater dentro do campo democrático, dentro das regras do jogo. Assim, a classe média tradicional acredita viver no pior dos mundos e não tem quem a represente dentro do jogo político, capaz de mudar essa situação. Quem não consegue jogar dentro das regras, quer novas regras. Daí defenderem impeachment, prisões sem processos e outras idiotices do gênero. Isso é culpa de uma oposição sem proposta, sem projeto.

     

     

    Pronto: 1 + 2 = ?. Um grupo insuflado, egoísta, sem ver a luz no fim do túnel, quer, logicamente, mandar as favas as atuais regras do jogo, criando novas que lhe sejam benéficas.

  9. Este talvez seja o tema

    Este talvez seja o tema crucial para a democracia brasileira, para suspender a atuação vergonhosa de um jornalismo canalha (créditos para Millôr Fernandes) e atuação de baixíssimo nível, tanto do próprio ponto de vista do jornalismo quanto de um entretenimento que não seja de tanto mau gosto e apelativo.

  10. Aliás, não só no setor mídia

    Aliás, não só no setor mídia o Brasil tem a peculiaridade de abrigar capitalistas anti-concorrência. É uma prática comum a todos os setores empresariais do país. Resumindo, eles continuam dependentes das fartas tetas do Estado desde 1500. Pois por aqui ainda prevalece a ideia anti-democrática e anti-econômica de que dinheiro público para o rico é investimento e para o pobre é gasto. E estamos conversados!

  11. Mas do que competição.

    Nassif, o que seria necessário ser feito neste setor, era rever os conceitos que estão nos contratos de concessão pública, que o Estado permite aos concessionários, que jamais são cumpridos, sequer respeitados.

    Claro que quando esta concessão é feita, sabe-se que os concessionários irão procurar ganhar dinheiro, captando recursos estatais e privados, para divulgarem nestes órgãos de informação, os produtos, serviços e ou realizações dos órgãos públicos. Até aí, nenhuma irregularidade, afinal estamos numa economia de mercado, porem como em todos os contratos de concessão, existem os deveres, e não somente os direitos, e é aí, que “o bicho pega” pois nenhum destes “Barões” da grande mídia, respeita os limites e mantem-se dentro da ética e do respeito à Constituição, não somente avançando nas verbas publicitárias, com uma gula incomum e prejudicial aos pequenos deste setor, para os quais, quase nada sobra.

    Mais ainda: Jamais houve tamanha apologia ao desrespeito ao Estado, à desobediencia civil, e ao crime com a certeza da impunidade, como está ocorrendo agora, em todos os veículos de comunicação de massa, em todos os níveis, como ora ocorre.

    Definitivamente, chegou a hora de aprovarmos a Ley dos Médios.

  12. Capitalismo , ora!

    Essas coisas acontecem na mídia e em todos os segmentos do mercado. Alguém possui informações sobre a Nestlé, a Coca Cola, a Brahma, Johnson&Johnson, P&G, etc, etc ?  Alguma lei vai corirge estas “distorções”? A Votorantim vai pagar a multa bilionária? A “democratização” da mídia não irá impedir que o grande pressione o pequeno.Apenas mudarão as estratégias.

  13. Nassif, a imprensa no Brasil

    Nassif, a imprensa no Brasil nunca serviu ao povo desse país. Nem nos primórdios, muito menos nesses últimos tempos. Assim, o povo não precisa dela. O povo precisa que quem o respeita, informa e o defenda. O modelo não serve mais. Degradou-se, corrompeu-se, aviltou-se e suicidou-se. Os jornalistas do modo que conhecemos, não são mais úteis e os que ainda resistem sofrem todo tipo de pressão. Os mais fracos se venderam e nada mais têm a perder, pois tudo já foi jogado na lata do lixo, inclusive seus caracteres. São maus atores de uma ópera bufa. Uma pena para uma nação jovem, que quer ser grande, pois grande é a nação que tem uma imprensa livre, autônoma e isenta, assim também devem ser aqueles que servem a ela. Caberá aos verdadeiros jornalistas a tarefa hercúlea de salvar suas imagens, caso contrário, todos ficarão tão sujos, que nunca mais serão reconhecidos.

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