Apesar das críticas, CNJ aprova implementação do Processo Judicial Eletrônico

Do Estadão

CNJ aprova processo judicial eletrônico em meio às críticas de advogados e servidores

Entidades criticam problemas como ineficiência e dificuldades técnicas de sistema que ainda está em fase de testes; Conselho decidiu adotar sistema em votação unânime

por Fausto Macedo e Mateus Coutinho

Na última sessão do ano,realizada nesta terça-feira, 17, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, por unanimidade, a implantação do Processo Judicial Eletrônico em todos os tribunais do país – independentemente se têm ou não sistemas próprios mais avançados para o gerenciamento de ações. A nova regra, contudo, não é unanimidade entre os advogados, juízes e servidores do Judiciário, que criticam o fato de o Processo Judicial Eletrônico (PJe) ainda estar em fase de testes e ter se mostrado ineficiente em alguns Estados.

Antes da sessão desta terça-feira, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil junto com a Associação dos Advogados Trabalhistas (ABRAT), a Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), o Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e o Movimento de Defesa da Advocacia (MDA) entregaram um manifesto ao CNJ. Nele, os representantes dos advogados levantam 20 pontos que consideram essencial para a transição segura do processo em papel para o processo eletrônico.

Dentre as demandas levantadas pelos advogados no manifesto estão o acesso irrestrito ao Pje, o estabelecimento de um cronograma para unificar as versões do Pje dos tribunais de todo o País e a criação de um sistema de atendimento aos usuários do sistema, com equipe técnica suficiente.Para o vice-presidente da Abrat, Nilton Correia, “o PJe deveria existir para facilitar, mas vem causando sofrimento com a obstrução ao acesso à justiça”.

Correia disse que a Abrat tem uma grande preocupação de ordem política devido ao processo de formularização que o CNJ quer implantar no País, utilizando o PJe como primeiro passo para essa finalidade. “O direito é constituído de argumentos, não de simples preenchimento de formulários”, completou.

Luis Cláudio Silva Alemand, conselheiro da OAB, afirmou ainda que esse sistema precisa ser mais debatido e aperfeiçoado para cumprir seu dever de dar acesso ao Judiciário, sendo bom para todos e de fácil usabilidade. Porém, segundo ele, “há sérios problemas estruturais e somos todos vítimas dessa plataforma do CNJ”. Alemand disse que a OAB está se equipando, treinando os advogados e abrindo linha de crédito para a aquisição de computadores.

O conselheiro ainda faz questão de ressaltar que a OAB não é contra o Pje, mas sim luta pelo seu aprimoramento.A Ordem pediu a realização de auditoria externa no PJe, para verificar a segurança dos procedimentos de preservação de documentos em meio eletrônico, de acesso, dentre outros. Segundo a entidade, há relatos de que aparece no sistema um botão para excluir uma petição que não tinha sequer sido de autoria do advogado que estava conectado à rede.

Tribunais. Além dos advogados, na semana passada, 24 diretores de Secretaria do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná criticaram o PJe por meio de um manifesto direcionado ao presidente da corte. A iniciativa também foi alvo de reclamações da direção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região recentemente.

“A morosidade e a lentidão são palavras de ordem no PJe-JT. Nele nada acontece e nenhum ato é concluído sem que o magistrado ou o servidor navegue por uma infinidade de telas, clique dezenas de vezes, efetue sucessivas gravações e confirme cada etapa de uma determinada operação, num emaranhado incompreensível de idas e vindas”, afirma um trecho do manifesto assinado pelos diretores de Secretaria do TRT do Paraná. Os diretores lembram, no documento, dos “infortúnios” causados pelo PJE nos TRTs do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Minas Gerais e afirmam que o descontentamento é geral entre juízes, advogados e servidores.

Segundo os diretores, o programa foi inserido na Justiça do Trabalho “em módulos inacabados e imperfeitos”. E, mesmo após dois anos de funcionamento, ainda não tem “instrumentos indispensáveis às atividades dos magistrados e às rotinas de trabalho dos servidores”. De acordo com eles, o PJe “impôs aos magistrados uma série de tarefas rotineiras e previsíveis que até então eram desempenhadas por servidores”, o que deixa a Justiça do Trabalho mais lenta. Eles criticaram, ainda, a falta de controle estatístico pelo programa. E disseram que “magistrados que atuam em Varas do Trabalho com PJe-JT tiveram de improvisar, criando notas pessoais de controle de suas atividades”.

De acordo com os diretores, se houver um documento pendente de assinatura pelo juiz, nenhuma outra ação poderá ser praticada pelo servidor até a conclusão daquela etapa. Outro ponto que é alvo de crítica é o fato de que os servidores só podem elaborar uma guia de retirada por vez, de forma que ele precisa esperar o magistrado assinar a primeira guia para elaborar as outras.

Com isso, um processo que atualmente demora alguns minutos, já que os magistrados costumam assinar os despachos e documentos no final do expediente, poderia durar semanas, considerando que cada processo envolve, em média, a expedição de seis guias.

Os diretores chegam a mencionar, inclusive, que “o uso indiscriminado do mouse e do teclado no modelo de trabalho imposto pelo PJe-JT” vai causar lesões por esforços repetitivos e de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho para servidores e magistrados.

Outro tribunal que se mostrou insatisfeito é o TRF da 4ª Região. A corte opera há mais de 10 anos com o e-proc, sistema de processo eletrônico. A adoção exclusiva do PJe, como quer impor o CNJ, preocupa os magistrados. ”Os tribunais estarão impedidos, na prática, de fazer investimentos nos seus sistemas. E, sem estes investimentos, um programa fica defasado e morre”, afirma o juiz-assessor da Presidência do TRF-4, Eduardo Tonetto Picarelli.

Audiência pública. No início de dezembro, a Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados fez uma audiência pública para discutir o PJE. O deputado Dr. Grilo (SSD/MG), responsável pela iniciativa, afirmou que o sistema vem apresentando muitas falhas. Ele citou o problema ocorrido no Rio de Janeiro no mês de outubro, quando mais de 2,2 mil audiências foram canceladas devido ao apagão digital que paralisou o PJe-JT. Ele mencionou ainda a paralisação no sistema durante 71 dias neste ano. E mais: que o TST recebeu mais de 22 mil assinaturas contrárias ao PJe. Para ele, “a informatização é inevitável, mas é preciso haver segurança jurídica”.

Confira a íntegra do voto do relator, o conselheiro Rubens Curado Silveira

Confira o manifesto das entidades de advogados encaminhado nesta terça ao CNJ

Redação

5 Comentários

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  1. PJE
    Ao que se sabe, o Conselheiro Acácio, perdão, Curado, é um dos “pais da criança” ou seu padrinho… o voto não poderia ser outro.
    Os demais, provavelmente não sabem do que se trata…
    heheheh
    Saravá e boas festas!!!

  2. Participei e acompanhei de

    Participei e acompanhei de perto a implantação da digitalização no STJ, que foi o pioneiro. Lá os processos são digitais há anos. Não há argumentos contra. Apenas o lobby dos que se aproveitam da justiça lenta. As resistências são todas de SP.

    Para a implantação o antigo presidente ia todo dia as 9 no local onde novos funcionários trabalhavam em processo semi escravo para digitalizar tudo em scanners. Depois,estes funcionários descobriram que outros concursados podiam ler mails, ir ao banheiro e usar internet durante o expediente,lol,foi um problema.

    O presidente,Cesar Asfor, era aquele que Lula deveria ter indicado ao STF mas Lula preferiu escolher um negro.

    Como todos sabem, sábia escolha.

    Lula tinha prometido a vaga para Cesar mas decidiu dar para um negro.

    Como ele faz pra resolver a situação? De maneira política logico. Começa a soltar notinha em jornal atacando a honra de Cesar. Que obviamente abre mão.

    Não e gente boa o Lula? Eu teria dado um telefonema…mas o cara é político. E político só sabe fazer isso.

  3. Veio para ficar!

    O avanço mais significativo na arcaica estrutura operacional do Poder Judiciário que vi em meus 40 anos de labuta em suas entranhas!

    Hoje o advogado pode, mesmo de férias, e antes de iniciar seu laser diário, logar-se e ver a quantas andam seus processos, do lugar em que estiver, passar as instruções para quem ficou no escritório e, ao final do dia ou mesmo depois do jantar, ver se estas foram seguidas, revisando inclusive as petições, pela simples razão de que hoje não mais é mais necessário ir ao escritório para trabalhar, nem ir ao fórum para ficar “namorando” os processos. Antigamente tinha uns advogados que iam todo dia no fórum para ficar horas e horas namorando seus processos, e folheavam, e anotavam, e voltavam no começo, e tudo de novo – e nós escrivães de butuca para ser se o tal não ira sumir com alguma folha dos autos (segundo reza a lenda teve um advogado que simplesmente comeu um cheque que se encontrava em um processo de cobrança contra seu cliente – dizem que apareceu no cartório com uns óculos fundo de garrava, que exigia uma leitura bem de perto; numa dessas, foi-se o cheque!)

    É claro que os procedimentos necessitam de aprimoramento, do desenvolvimento de algumas ferramentas que agilizem os trâmites processuais e, principalmente, treinamento, muito trieinamento mesmo, em especial na justiça de primeira instância, que anda meio emperrada (os Tribunais estão bem mais avançados e quase não apresentam problemas significativos). Mas, mesmo assim, não dá para sentir saudades do tempo da máquina de datilografia manual, cujos mandados eram expedidos em inúmeras vias com papel carbono (que evoluiu para a máquina elétrica, depois para o 286, o 386 etc)! 

    Bem, estou me referindo à experiência do Poder Judiciádio de Mato Grosso do Sul, que está bem a frente nesse processo!

  4. Impressiona verificar a força

    Impressiona verificar a força dos “lobbies” contra o processamento eletrônico no judiciário. Como a plataforma é linux, ficam os microsoftianos à míngua de contratos. Daí, o berreiro. Outros tribunais, como os do trabalho, estão se dando conta da ineficiência e da desproporcional existência de mão-de-obra ociosa com a implantação; por conta disso, estão estudando o “enxugamento” de pessoal (ou seja, diminuição e botar os que ficam para trabalhar), daí o gritedo; a quarta regional da federal, por exemplo, mesmo sabendo que o processamento do CNJ estava vindo para ficar, teimou em produzir seu próprio “arsenal” eletrônico (qual a razão?), andando na contra mão, agora, reclamam? Houvessem escutado com parcimônia o futuro disponível, poderiam ter poupado dinheiro e tempo (aliás, o e-proc é o processo eletrônico do CNJ que não vingou: descartado que foi pelo Conselho). Agora, com certeza, o processo eletrônico do CNJ exige, sim, atenção e aprendizado por todos (e não há como chamar o técnico da microsoft). E, por fim, creio que o pessoal do CNJ, se quiser, ou se achar necessário, tem respostas racionais para cada um dos ítens elencados pelos do contra (mas, não acredito que os do contra queiram ouvir). De mais a mais, não seria o CNJ irresponsável a ponto de impor algo que não funcione ao país como um todo. E, com certeza, a fase de testes já passou – com louvor – há muito tempo.

    1. concordo

      Concordo plenamente. Por trás de todas críticas (a maioria infundadas) está o interesse financeiro de empresas privadas em vender sistemas caríssimos e que permitem o vazamento de informações que deveriam ser de acesso restrito do Judiciário.

      No TRT9 os diretores da Capital que criticam o PJe o fazem sem saber do que falam, uma vez que não utilizam o sistema que só foi implantado em algumas Varas do interior.

      Os que usam e criticam fazem sem se esforçar para entender o PJe e assim bem utilizá-lo.

      E isso ocorre também porque o TRT9 também optou por criar um sistema particular mesmo sabendo da inevitável implantação do PJe… 

      Lamentável a atitude dos detratores e críticos do PJe… fazem o jogo do mercado, defendendo interesses espúrios de corporações privadas que sangram os cofres públicos com seus sistemas caros e inseguros.

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