Carta de Roberto Amaral denota mais uma divergência com Marina Silva

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Uma carta de Roberto Amaral ao cientista político Moniz Bandeira denota mais uma divergência entre as bandeiras históricas do PSB e o programa de governo da candidata Marina Silva.

Após discordar publicamente quanto à independência do Banco Central e aos nomes escolhidos por Marina para elaborar propostas para economia, Amaral, também responsável pelo PSB-Internacional, disse que não deixará de defender a “política externa soberana e à aproximação com nossos irmãos africanos e latino-americanos”, mesmo com Marina na cabeça da chapa majoritária à Presidência da República.

Conforme o GGN publicou no início de setembro, o programa de Marina para relações internacionais segue uma linha aecista: menos Mercosul e mais potências do norte ocidental. Leia mais clicando aqui

Abaixo, a carta de Roberto Amaral a Moniz Bandeira, publicada originalmente no site do PSB.

Rio de Janeiro, 26 de setembro de 2014

Estimado professor Moniz Bandeira

Respondo à sua carta-aberta, enviada de seu privilegiado posto de observação em St. Leon-Rot, Alemanha.

Devo-lhe respeito e admiração. Acompanho sua produção literária. Dela é devedor nosso país.

Considero sua liberdade e independência intelectuais, de “livre pensador”, condição que não posso arguir. Militante engajado, tenho compromissos com projetos, ideias e valores expressos em programa partidário que não pode ser alterado ao sabor de especulações como a de que a queda de uma aeronave resultou de conspiração estrangeira. Tampouco posso guiar-me por “premonições”. A famosa ‘realidade objetiva’ não me permite.

O processo político-partidário, mesmo sem o “centralismo democrático”, impõe limites ao millordiano “livre pensar é só pensar”. Certamente, o professor ainda admira aquele autor que escreveu: “Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem como querem, não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”.

Caminhei, da juventude no antigo PCB, para, na maturidade, refundar o PSB ao lado de Antônio Houaiss, Jamil Haddad e, a partir de 1990, Miguel Arraes. Construímos permanentemente, no Partido, pontes para o futuro. O PSB não abandonará o embate contra as desigualdades sociais, pela reforma agrária, pela defesa do meio-ambiente, pelo domínio de novas tecnologias, pela ampliação e melhoria do sistema de ensino e pela segurança do cidadão; não renunciará à luta pelos grandes projetos estratégicos, sejam os de infraestrutura para o desenvolvimento social e econômico, sejam os que darão suporte ao seu papel como ator global. Aqui me refiro, inclusive, às iniciativas que respaldarão militarmente a política externa soberana e à aproximação com nossos irmãos africanos e latino-americanos. O PSB não arrefecerá seu compromisso de atuar como protagonista na construção da nação brasileira e não fará concessões aos desvios do patrimônio público.

Renunciaria, ai sim, à presidência do PSB caso essas proposições fossem abandonadas. No calor de campanhas eleitorais sobram boatos e acusações sem eira nem beira. Eleições passam, professor, o país fica; o processo histórico segue sua marcha, a política sobrevive, os partidos ficam. Alguns, com ideários descaracterizados; outros, mais apegados aos seus princípios.

Como dirigente do PSB, cabe-me zelar pelo cumprimento de nossos compromissos programáticos, observada a realidade objetiva. É o que farei. Mancharia minha biografia se, acossado por premonições e pela libertinagem do “livre pensar”, optasse pela cômoda retirada nesse momento tão rico da construção da democracia brasileira.

Com apreço,

Roberto Amaral

Presidente do Partido Socialista Brasileiro

Abaixo, a carta-aberta do cientista político Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira ao presidente Nacional do PSB, professor Roberto Amaral. Nela, Moniz Bandeira pede que Amaral deixe o partido em função de Marina.

Estimado colega, Prof. Dr. Roberto Amaral

Presidente do PSB,

A Sra. Marina Silva tinha um percentual de intenções de voto bem maior do que o do governador Eduardo Campos, mas não conseguiu registrar seu partido – Rede Sustentabilidade – e sair com sua própria candidatura à presidência da República.

O governador Eduardo Campos permitiu que ela entrasse no PSB e se tornasse candidata a vice na sua chapa. Imaginou que seu percentual de intenções votos lhe seria transferido.

Nada lhe transferiu e ele não saiu de um percentual entre 8% e 10%. Trágico equívoco.

Para mim era evidente que Sra. Marina Silva não entrou no PSB, com maior percentual de intenções de voto que o candidato à presidência, para ser apenas vice.

A cabeça de chapa teria de ser ela própria. Era certamente seu objetivo e dos interesses que representa, como o demonstram as declarações que fez, contrárias às diretrizes ideológicas do PSB e às linhas da soberana política exterior do Brasil.

Agourei que algum revés poderia ocorrer e levá-la à cabeça da chapa, como candidata do PSB à Presidência.

Antes de que ela fosse admitida no PSB e se tornasse a candidata a vice, comentei essa premonição com grande advogado Durval de Noronha Goyos, meu querido amigo, e ele transmitiu ao governador Eduardo Campos minha advertência.

Seria um perigo se a Sra. Marina Silva, com percentual de intenções de voto bem maior do que o dele, fosse candidata a vice. Ela jamais se conformaria, nem os interesses que a produziram e lhe promoveram o nome, através da mídia, com uma posição subalterna, secundária, na chapa de um candidato com menor peso nas pesquisas.

O governador Eduardo Campos não acreditou. Mas infelizmente minha premonição se realizou, sob a forma de um desastre de avião. Pode, por favor, confirmar o que escrevo com o Dr. Durval de Noronha Goyos, que era amigo do governador Eduardo Campos.

Uma vez que há muitos anos estou a pesquisar sobre as shadow wars e seus métodos e técnicas de regime change, de nada duvido. E o fato foi que conveio um acidente e apagou a vida do governador Eduardo Campos. E assim se abriu o caminho para a Sra. Marina Silva tornar-se a candidata à presidência do Brasil.

Afigura-me bastante estranho que ela se recuse a revelar, como noticiou a Folha de São Paulo, o nome das entidades que pagaram conferências, num total (que foi, declarado) R$1,6 milhão (um milhão e seiscentos mil reais), desde 2011, durante três anos em que não trabalhou. Alegou a exigência de confidencialidade. Por que a confidencialidade? É compreensível porque talvez sejam fontes escusas. O segredo pode significar confirmação.

Fui membro do PSB, antes de 1964, ao tempo do notável jurista João Mangabeira. Porém, agora, é triste assistir que a Sra. Marina Silva joga e afunda na lixeira a tradicional sigla, cuja história escrevi tanto em um prólogo à 8a. edição do meu livro O Governo João Goulart, publicado pela Editora UNESP, quanto em O Ano Vermelho, a ser reeditado (4a edição), pela Civilização Brasileira, no próximo ano.

As declarações da Sra. Marina Silva contra o Mercosul, a favor do subordinação e alinhamento com os Estados Unidos, contra o direito de Cuba à autodeterminação, e outras, feitas em vários lugares e na entrevista ao Latin Post, de 18 de setembro, enxovalham ainda mais a sigla do PSB, um respeitado partido que foi, mas do qual, desastrosamente, agora ela é candidata à presidência do Brasil.

Lamento muitíssimo expressar-lhe, aberta e francamente, o que sinto e penso a respeito da posição do PSB, ao aceitar e manter a Sra. Marina Silva como candidata à Presidência do Brasil.

Aos 78 anos, não estou filiado ao PSB nem a qualquer outro partido. Sou apenas cientista político e historiador, um livre pensador, independente. Mas por ser o senhor um homem digno e honrado, e em função do respeito que lhe tenho, permita-me recomendar-lhe que renuncie à presidência do PSB, antes da reunião da Executiva, convocada para sexta-feira, 27 de setembro. Se não o fizer – mais uma vez, por favor, me perdoe dizer-lhe – estará imolando seu próprio nome juntamente com a sigla.

As declarações da Sra. Marina Silva são radicalmente incompatíveis com as linhas tradicionais do PSB. Revelam, desde já, que ela pretende voltar aos tempos da ditadura do general Humberto Castelo Branco e proclamar a dependência do Brasil, como o general Juracy Magalhães, embaixador em Washington, que declarou: “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil.”

Cordialmente,

Prof. Dr. Dres. h.c. Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

11 Comentários

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  1. Roberto Amaral jah foi

    Roberto Amaral jah foi tratorado e nem se deu conta. Dizer que vai prezar pela soberania eh grito no vazio, pois o Alien, oitavo passageiro, jah dominou a barriga do PSB e seus filhotes jah dao as cartas. Nem a Sigurney Weaver darah jeito…perdeu Amaral…perdeu.

  2. Não é exatamente

    Não é exatamente divergente.

    Trata-se de incompatibilidade que a busca pelo poder não deixou os históricos do PSB perceberem.

  3. Até compreendo e respeito a

    Até compreendo e respeito a tentativa de Roberto Amaral de preservar um partido histórico, fundado há quase setenta anos. Mas tá difícil. O presidente falecido deixou um “núcleo duro” que se integrou com gosto ao projeto dos “forasteiros”. Além disso, um olhar mais atento às notícias e acontecimentos pós tragédia, revela uma participante feminina de muito poder político ditando as regras.

  4. se ele mantiver o que disse,

    se ele mantiver o que disse, tá fora.

    porque o que amaral disse

    não combina com o que marina

    propõe.

    aliás, se marina propusesse tudo isso,

    estaríamos todos mais tranquilos

    porque finalmente teríamos duas propostas

    fundamentais que propiciariam o

     avanço conseguido nestes últimos doze anos

    com lula e dilma…..

  5. Acorda Amaral!

    Se a Marina for eleita[o que não ocorrerá], o Amaral, se confirmado à frente do PSB, o que duvidododo(se bem que, por questão desta eleição isso seja possível) poderia continuar defendendo seu programa e até de exercer o jus esperniandi, pelo menos isso, ao mesmo tempo em que Marina marcharia em frente com Neca do Itaú e cia mandando ver na desmontagem do pré-sal, na entrega dos BC com seus mais de 300 bilhões de reservas aos banqueiros e, de cá, o pobre Roberto Amaral com seu PSB esperneando…hum….O que ocorre é a zelite tupiniquim, que de boba não  tem nada, tratou de arrumar uma candidatura que pudesse usar uma máscara de Lula. Serra tentou usar essa máscara em 2010 mas ninguém acredito, Marina consegue enganar mais que Serra. Tudo montado e nem dúvido que, como tem defendido jornalistas americanos, a queda do avião tenha sido obra da engenharia demoníaca do Tio Sam(clqiue aqui), eles sabiam que só com Marina os sem votos teriam alguma chance. Afinal de contas, o ódio contra o PT, que vinha sendo inocudado no (e)leitorado há anos,  poderia dar em nada. O envenenamento da população contra um PT que foi alvo de pancadaria por todos estes anos teria que render para neoliberais saudosos dos velhos tempos de FHC. E ódio é que não faltou por todo este tempo e, claro, a história tem demonstrado que estas campanhas de ódio tem lá seus efeitos: Como relatou o jornalista Jânio de Freitas, até a véspera de seu suicídio, a população espumava de odio contra Getúlio, isso por causa de uma campanha midiática como essa que temos presenciado contra o PT por todos estes anos, com direito a platéia VIP do Itaquerão entoar o vergonhoso coro do  “Dilma Vai Tomar no Cu” puxado por Globais e herdeiras  de banqueiros, gente interessada em enfiar goela abaixo da classe média mais ódio e, num segundo momento, virem com conceitos “sofisticados” como o da “alternância de poder”(desde que não seja em SP). A visão tosca dessa gente é que, a par de reconhecer os avanços, sustenta a tese de que o PT tem que ser varrido do mapa mesmo que o pais caminhe em direção ao abismo. Vamos dar uma chanche a Marina, dizem. Como é que é? Dar chance para que os abutres que cercam Marina arranquem teus olhos…Claro que não estamos diante de uma luta pela alternância de poder e sim de uma disputa entre dois projetos,  um que combina desenvolvimento com justiça social, representado por Dilma, e o outro, o do estado mínimo para o povão e máximo para o 1%, este encabeçado por Marina e, se esta não vingar, com Aécio. Acorda Amaral!

  6. Roberto Amaral e Erundina, Estranhos no Ninho [Tucano]?

    Boa tarde.
    A carta de Roberto Amaral é tão anódina, tão perfunctória que se repute duvidar de que não tenha sido escrita pela “educadora” Neca ou pelos “cabeças de planilha” (d. a. Nassif). Fica difícil saber quem está mais desconfortável, neste neo-ninho sonhático (sic!): ele ou a antes indignada Erundina.
    Quer conhecer um homem? Dê-lhe Poder e | ou Vinho.
     

  7. O PSB já fez sua reviravolta

    O PSB já fez sua reviravolta e se tornou a tão sonhada por muitos Direitona Raivosa. Incrível para um partido que tem o S, como muitos , na sigla. O S só serve mesmo para enganar os trouxas: PSDB, PPS, e agora PSB. O PSol ainda se salva, por enquanto, apesar do Randolfe.

  8. Mais uma jabuticaba: Partido Socialista Neoliberal!

    “Eleições passam, professor, o país fica; o processo histórico segue sua marcha, a política sobrevive, os partidos ficam. Alguns, com ideários descaracterizados; outros, mais apegados aos seus princípios.”

    Qual sera o legado do PSB apos essa eleição ? Apegado aos seus principios. Oui seja: ao Socialismo ? Ou o partido dos idearios descaracterizados.

  9. Livre Pensar

    Millor, citado por Roberto Amaral na resposta a Moniz Bandeira, é bom de frases, mas as interpretaçoes que fazem delas nem sempre estão à altura delas. Dois exemplos: “Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados” e “Livre pensar é só pensar”, esta mencionada por Amaral.

    No primeiro exemplo, há uma objeção preliminar. Jornalismo é realmente oposiçao, ou informação? Se for oposição, é oposição a quê? A qualquer governo? Se for a qualquer governo, o jornalismo seria então promotor do anarquismo (“¿Hay gobierno? ¡Entonces, soy contra!”). Jornalismo seria, então, instrumento de promoção do anarquismo? Na prática, não parece ser. A se considerar, por exemplo, o que disse a folhetinesca Dna. Judith (prócer jornalística imersa voluntariamente em organizações com governo) jornalismo seria oposição sim, mas não a qualquer governo, só ao governo do PT (jamais se ouviu a Sra. se opor ao governo do PSDB paulista). Mas a imprensa não é formalmente partido político. Se fosse, não informaria direito. Aliás, se for oposição, como queria Millôr, não informará corretamente (imagine um IBOPE na oposição). Assim, sem muitos aprofundamentos, pode-se dizer que, para desespero de Millôr, muitos fazem do “jornalismo de oposição” algo que seria bom se fosse como um “armazém de secos e molhados” (o que Millôr tinha contra armazéns de secos e molhados, mesmo?).

    Livre pensar não é só pensar. O pensamento livre das amarras das circunstâncias, diferentemente do que insinua Amaral em sua carta apoiado na frase de Millôr, é muito mais do que apenas pensar, o que já é muito, convenhamos. Tome-se a geometria euclidiana. Essa geometria, dentre muitos outros exemplos, é fruto de livre pensar. Apóia-se em coisas sem existência real, como ponto, reta, plano, livre, portanto, de quaisquer amarras circunstanciais e mesmo físicas. No entanto, aplica-se a tudo, é um livre pensar completamente conectado ao concreto, ao prático. Do livre pensar decorrem novos caminhos e inovações imprescindíveis concretos, muitas vezes impossíveis de serem vislumbrados se estivermos toldados pelas circunstâncias. Às vezes, como parece ser a intenção de Moniz Bandeira em relação ao PSB, o livre pensar serve para nos repor na trilha da ética.

    No caso do PSB, o que Moniz Bandeira faz, distanciado das circunstâncias, é olhar com clareza os aspectos éticos do PSB que estão sendo torcidos pelo fenômeno Marina. Este olhar é absolutamente necessário. Compete a Roberto Amaral, claro,  conduzir essa dialética Marina-princípios partidários. Não cabe a ele, contudo, menosprezar a importante contribuição de Moniz Bandeira sob a desculpa de que “livre pensar é só pensar”. Pense nisso, Amaral.

  10. o Partido

    o Partido Neolíberosocialista, malufou, está na galeria ao lado de Bornhausen, Heráclito Fortes, Agripino, etc . . . e depois mesmo que recomendou não dar continuidade nas ações Anistia/Ditadura, pode-se dizer que se DOI-CODIficou . . . . . .

  11. Ou o homem ficou

    Ou o homem ficou completamente cego ou quer fazer-se de cego para não enfrentar a terrível realidade. A adrenalina do processo eleitoral, realmente, deixa cego qualquer político descuidado, sobretudo em corredeira tão eletrizante como essa. O erro do PSB veio lá de trás, quando se dispôs a servir de elevador para guindar os sonhos egoístas do irresponsável senhor Eduardo Campos, comprometendo a aliança de esquerda e pondo a nação em grande perigo de cair nas garras de seus inimigos externos e internos. A História não absolverá Roberto Amaral nem mesmo por conta de sua bela biografia anterior a este fatídico ano de 2014.

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