Medo da violência pode dar o tom das campanhas em 2014, por Sakamoto

Sugerido por MiriamL

Do blog do Sakamoto

Em 2010, a campanha virou conclave. Em 2014, pode virar escolha de carrasco
 
Leonardo Sakamoto
 
Um parlamentar com histórica atuação em defesa dos direitos humanos me confessou ontem, na Câmara dos Deputados, uma aposta para as eleições do ano que vem. Disse que, enquanto a campanha de 2010 foi algo como um conclave, em que parecia não estarmos escolhendo um presidente da República e sim um novo papa por conta dos temas alçados ao debate público, 2014 será o ano de enterrar os direitos humanos em discussões associadas à questão da segurança pública. Mais que em outros pleitos.
 
Ele não diz que os temas inspirados pelo sobrenatural não estarão presentes, pelo contrário. Mas que a grande estrela no atentado aos direitos humanos serão questões que explorem o medo da violência. E apontou a questão da redução da maioridade penal de 18 para 16, 14 ou até 12 – como se discute em corredores do Congresso Nacional – como o tema.
 
O parlamentar não acredita que nenhum dos quatro principais pré-candidatos até agora – Dilma, Aécio, Eduardo e Randolfe – irão abraçar um discurso mais conservador-religioso, apesar da influência de seus partidários e coligados. Pelo menos, não abertamente. Isso poderia depor contra uma imagem de modernidade e renovação que eles devem assumir para tentar conquistar o eleitorado.

 
E a Santa Inquisição, que reinou por aqui no segundo semestre de 2010, está diretamente relacionada a isso. Olha, eu que não creio, passei a acreditar no inferno naquela campanha. Você é favor do aborto!… Sua esposa já fez um aborto!… O candidato X vai para o inferno porque defende a eutanásia!… Você confirma que manterá todos os crucifixos que embelezam repartições públicas se for eleito?… Acredita em vida após a morte?… Duvida do poder da Grande Abóbora?
 
Uma pesquisa Datafolha feita, em abril deste ano, após casos envolvendo jovens em crimes violentos, apontou que 93% dos paulistanos apoiaria a redução da maioridade. Desses, 35% concordavam com a redução para uma faixa entre 13 e 15 anos e 9% para 12 anos. O que me surpreendeu, a bem da verdade, não foram os 93%, mas que ainda contávamos com 6% que não se deixaram levar pela histeria coletiva em momento de emoção a flor da pele (1% não opinaram).
 
Esse debate, infelizmente, tanto quanto o da campanha de 2010, que envolvia direitos individuais, saúde pública e religião, ainda é carregado de achismo e superficialidade.
 
Com o tempo, mantendo-se o tema em foco e ampliando a percepção de que a solução para crianças e adolescentes que cometem crimes é mais profunda e complexa do que simplesmente jogá-los na cadeia e esquecer a chave em algum lugar, tenho a esperança (palavra que, mais dia, menos dia, será cassada pelo pastor Marco Feliciano, presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados), de que muita gente sairia do obscurantismo.
 
O problema é que, ao contrário do que aponta o senso comum, a campanha eleitoral não é o melhor momento para a discussão de temas públicos relevantes. Pelo contrário, é quando marqueteiros dobram a realidade, procurando mexer com a emoção e não a razão dos eleitores. Qualquer tema que seja visto com potencial de angariar ou tirar votos será tratado como um carro em anúncio de TV. E vendido como tal. Ou seja, a verdade sobre o objeto em questão é um mero detalhe.
 
Nesse sentido, tenho que reconhecer que deve ser obra do divino o fato de que plebiscitos não são usados a torto e direito por aqui. Porque a garantia dos direitos fundamentais não pode ser efetivada com base em pesquisas de opinião ou para onde sopra a opinião pública em determinado momento depois de um crime bárbaro.
 
Afinal de contas, uma democracia verdadeira passa pelo respeito à vontade da maioria, desde que garantindo a dignidade das minorias. Até porque, como sabemos, a maioria pode ser muito violenta. Como disse Oscar Wilde: “Há três tipos de déspotas. Aquele que tiraniza o corpo, aquele que tiraniza a alma e o que tiraniza, ao mesmo tempo, o corpo e a alma. O primeiro é chamado de príncipe, o segundo de papa e o terceiro de povo”…
 
O melhor momento para discutir o tema seria ao longo de todo o ensino básico, com anos de reflexão em salas de aula, mas também em outros espaços comunitários e sociais, com pessoas preparadas para levantar junto aos jovens todos os pontos de vista, convidando-os a refletir sobre eles. Mas, apesar de direitos humanos ser tema transversal na educação, não tenho nenhuma fantasia de que isso ocorrerá no curto prazo.
 
Ué, não conseguimos nem combater a homofobia e promover a tolerância nas escolas que grupos de evangélicos e católicos (que envergonham os demais evangélicos e católicos) já começam a chamar tudo de “Kit Gay”! Como se fosse possível um material didático forçar uma orientação sexual. Imagina então com uma educação real para os direitos humanos? Iam queimar professores em praça pública…
 
Enfim, 2014 promete fortes emoções para quem acha que a dignidade por aqui anda muito maltratada.
Redação

18 Comentários

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  1. “A sina da oposição: sobrevivência e terrorismo”

     

    A Globo está alucinada, veja só a manchete no online de hoje: “EM SIMULAÇÃO OFICIAL DO SORTEIO DA COPA, BRASIL CAI NO GRUPO DA MORTE”. É o caos em notícias do governo até em SIMULAÇÃO??? Esquisito isto. Muito esquisito. Vai de encontro a um artigo de Carta Maior:  “A sina da oposição: sobrevivência e terrorismo”. Até simulado serve de caos.

  2. “O parlamentar não acredita

    “O parlamentar não acredita que nenhum dos quatro principais pré-candidatos até agora – Dilma, Aécio, Eduardo e Randolfe – irão abraçar um discurso mais conservador-religioso, apesar da influência de seus partidários e coligados”

     

    Sakamoto gosta de posar de bonzinho, mas também nunca tem coragem de dar nomes aos bois.

     

    Todo mundo, absolutamente todo mundo sabe que o discurso “conservador-religioso” (na verdade direitista e fascistóide) foi introduzido pelo Serra, não teve nada a ver com a “influência de seus partidários e coligados”, especialmente no caso de Dilma.

    1. Não é assim.
      Até abril/2010

      Não é assim.

      Até abril/2010 Serra fazia um discurso até que moderninho, ainda que demonizando fumantes.

      Mas as alianças PT e PSC/PR/PRB foram confirmadas no final de 2009, quando o governo engavetou pela primeira vez o PLC 122, prestes a ser aprovado no Senado de então.

      Aí, em maio/2010 houve a formalização da coligação, as fotos públicas de Dilma com Feliciano, etc.

      Então Serra, temeroso de perder voto conservador, apelou e baixou o nível. Mas, cronologicamente, não foi ele quem introduziu o discurso conservador-religioso. Foi quem fez o pior discurso, é outra coisa.

      E é no caso da Dilma que justamente a influência de partidários e coligados foi muito maior, basta ver o governo dela, que assusta a qualquer um que acredita em secularismo e Estado Laico.

      Será que Serra teria retrocedido em tantos programas nos ministérios da saúde e educação? Nunca saberemos.

      http://www.jornalggn.com.br/blog/gunter-zibell-sp/como-superar-o-uso-do-obscurantismo-na-politica

  3. Excelente

    Sakamoto sempre muito bom. A falta de cidadania leva a tudo isso que o autor cita.

    Por isso Dilma queria 100% dos royalties do petróleo para a educação. e mesmo com as manifestações, como o discursos de todos os parlamentares de partidos de A à Z e de toda a sociedade, o congresso não aprovou integralmente.

    Não temos uma mídia que promova o aprofundamento dos temas, o nosso congresso submisso aos seus financiadores de campanha, o povo nas ruas escorrachado por todos.

  4. turismo

    a tempos leio que o automóvel deixou de ser a primeira indústria do mundo.

    agora é o turismo.

    como captar esse dinheiro existente no mundo? belezas naturais e outros atrativos os há abundantemente no Brasil.

    o que não há é segurança. brasileiro viaja para o exterior porque lá ele se  sente mais seguro  do que aqui.

    não temos uma fábrica de automóveis brasileira.

    o turismo caminha daqui para fora. o Brasil se torna a nação de oportunidades perdidas.

    enquanto isso, os coxinhas discutem………….bolsa família.

    1. Emerson57, o brasileiro viaja

      Emerson57, o brasileiro viaja ao exterior porque hoje ele tem grana para viajar e não por segurança. A minha filha e mais duas amigas ficaram mudando de calçada, fazendo peripécias em Paris para fugir de um assaltante que as perseguiam e só perceberam porque já tinham experiência em viagens internacionais. Ontem, o Ministro Aldo Rebelo respondeu a um jornalista estrangeiro e disse a mesma coisa, citou vários exemplos e ainda falou do agravante da violência e o medo de ataques terroristas que aqui não temos. Quem viaja para o exterior para se sentir seguro, com certeza, são artista pelo anonimato, aqueles cuja fonte de renda é duvidosa e ou ainda pessoas colonizadas(só o que tem nesse país) porque adoram falar mal do Brasil. Mazela por mazela todos os países têm.

  5. Medo do senso comum

    E de que me lembro, aqui no blog também ha uma corrente pela diminuição da maioridade penal. Na época do crime com jovens menores, a maioria absoluta pedindo para diminuir a maioridade e acho que éramos três ou quatro indo na contramão. 

    Se esse for o termômetro, se até nos meios mais politizados, cai-se na histeria coletiva, da para entrever como serão os debates no ano que vem. Candidatos como Dilma, Aécio, Randolfe, que não são conservadores, vão acabar, optando pela facilidade. 

    Mas enfim, espero que uma nova ordem venha ai, porque as coisas estão ficando muuito sombrias.

    1. Lembro disso, eu sou dos

      Lembro disso, eu sou dos poucos aqui que é terminantemente contrário à redução da maioridade penal. Ainda bem que esse trem é inconstitucional e só aparece para fazer discurso político.

      Eu também já falo há algum tempo por aqui que os demonizados da vez deixariam de ser os LGBTs e passariam a ser os menores de idade.

      Dilma terá que evitar o assunto, pois o PT (especialmente Cardozo) é contrário, mas vários partidos da base (PP, PMDB, PSC, PR, PRB) são tão favoráveis ao ponto de porem nos programas de TV deste ano.

      Aécio carrega o PSDB nisso: o senador Aloisio propôs mais uma (inconstitucional) PEC. E Alckmin propôs a extensão do tempo de detenção para menores de idade (de 3 para 8 anos, o que é menos pior que a redução de maioridade penal em si.)

      Eduardo ainda é uma dúvida, ele simplesmente não fala sobre nada, está mais ‘mineiro’ que Aécio. Eu, pessoalmente, aguardo ele se manifestar pelo combate à homofobia.

      Randolfe seguramente não fará discurso conservador moral. O foco dele não é fazer concessões para se eleger (o que é uma improbabilidade absoluta hoje), mas aumentar a bancada.

       

  6. O que ocorre no mundo é uma

    O que ocorre no mundo é uma rejeição ao liberalismo, consequência da crise econômica.

    O ruim é que a rejeição ao pensamento econômico acaba influenciando nas questões comportamentais envolvidas e o crescimento de um discurso religioso e muitas até medieval.

    Não vejo nada de assustador reduzir a maioridade penal, se até países mais avançados e com mais liberdades individuais que o nosso é permitido, por quê no Brasil tem que se permitir uma cultura de impunidade?

    O maior exemplo é a liberdade dos torturadores garantida pelos falsos profetas do STF.

  7. De que violência Sakamoto
    De que violência Sakamoto está tratando? Daquela engendrada pelo trafico de toneladas de cocaína cuja menor parte foi apreendida no helicóptero do amigo/parceiro de Aécio Neves no Espírito Santo ou da que é produzida em São Paulo porque falta Metrô para todo mundo em razão dos tucanos terem roubado bilhões da empresa? Seja mais especifico Sakamoto, por favor.

  8. Faz todo sentido .  Vão

    Faz todo sentido .  Vão complementar  o banquete da direita  religiosa e militarizada  com aquilo a que são doutrinadas ano após  ano para fabricar consenso.  Usarão  dados dentro de uma lógica onde faltam dados e por isso não é tão lógica assim.

  9. Por que não aprendermos com a

    Por que não aprendermos com a experiência sul-africana? Será que alguém consegue matérias da época com tradução? Lembro das notícias sobre arrastões e assaltos a jornalistas estrangeiros em hotéis das cidades onde as seleções jogaram. Lembro também de matérias feitas depois sobre os estádios que acabaram virando elefantes brancos. Quando Brizola fez o sambódromo cuidou da dar uma vida útil ao espaço fora do carnaval. Isto já vale pontos para nós. Ou deveria, mas a Copa  é dos cartolas daqui e de fora, caiu na inciativa privada com dinheiro público. Na África do Sul também houve boicote à Copa e toda sorte de sabotagem. Seria bom ter acesso a um balanço da experiência  por parte do governo e de críticos da África do Sul.

    1. cuidado com as palavras!

      Maria Rita, boa noite. Não houve dinheiro público. Houve jornalistas desonestos uns, mal informados outros, que ficaram martelando o tal “dinheiro público”. Se ninguém pagar, o Erário não perderá um centavo. Todo o dinheiro dos estádios foi e é PRIVADO. Agora, as obras do entorno, essas foram e estão sendo feitas com dinheiro público. Essas obras serão a herança da Copa, mesmo quem não gosta de futebol vai poder usar.

  10. Deveria justificar  meu

    Deveria justificar  meu comentário sobre a Copa sul-africana em relação ao texto que fala da violência que será o mote das eleições em 2014. Mas, inconscientemente, meu maior receio são os boicotes à Copa, depois da experiência desse ano. E falando em violência, depois de Datena e Marcelo Rezende, depois do vazio deixado pelo noticiário tupiniquim que um dia foi bom e de alto nível, o que resta? Seriados policiais e de espionagens, seriados de vampiros e de terror? Personagens de novelas e BBBs concorrendo aos vilões mais amados e copiados? CQCs, Lobão, Danilo Gentili e Rafinha? JB e Gilmar Mendes? Tá difícil enumerar as inspirações do tema.

  11.      Desculpe minha

         Desculpe minha ignorância! Mas, eu não sei exatamente o que implica diminuir a maioridade penal.

         Se diminuir para 14 anos, por exemplo, significa que se um indivíduo (para não chamar de criança) de 14 anos que cometer determinado crime receberá o mesmo tipo de julgamento, com o mesmo tipo de sentença, com o mesmo tipo de pena?

         Ele será colocado na mesma cela que pessoas de 25, 30, 40 anos de idade? Terá exatamente os mesmos tratamentos? Vai conviver com esses criminosos adultos? O que vão fazer com ele, exatamente?

         Outra coisa, é somente quanto a cometer crimes que ele não mais sera tratado como criança? Para o resto ele continua sendo tratado como uma criança, só quanto ao crime que ele não é mais criança? Certamente,  ele não vai ser considerado como adulto para outras coisas, como trabalhar, tirar carta, casar, consumir bebida alcoólica, etc.

         De qualquer forma, o que eu gostaria mesmo de saber é se o que vai acontecer com um indivíduo de 14 anos que cometer crime é ser lançado numa penitenciária igual ao que acontece com os adultos? Ou terá um tipo diferente de pena, de tratamento, de atividades, de recuperação, se supervisão, etc?

  12. Alguma medida tem que ser

    Alguma medida tem que ser tomada contra esses “PROGRAMAS POLICIÁIS” que estão se espalhando por todas as cidades do país.A criminalidade está sendo estimulada com a estranha proliferação desses  “programas” nos canais de Tvs ?  Estamos sofrendo um bombardeio de fatos terríveis diariamente !!!
    Estupro, tiroteios, assassinatos, tiros na cabeça, facadas, assaltos, invasões de lojas e residências, etc estão entrando em nossas casas em todos os horários:   manhã, tarde e noite.
    Esses programas, como certos filmes, não deveriam ter um horário mais adequado para exibição ?
    Qual a finalidade desses programas ?  Aterrorizar a população ?  Causar uma instabilidade social e política ?
    Inclua -se, aí a farta divulgação dos atos de vandalismo , quebra-quebra, etc nas “manifestações.
    Acho que se criarmos alguma restrição a esses programas, estaremos ajudando a controlar os acontecimentos durante a Copa.As TVs tem mesmo que exibirem essas coisas ? è o melhor que podem fazer ?
    Programas com vídeos de crimes e vandalismo só após as 23 horas.
    Os canais de TV estão usando esses programas como arma política !
     

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