Uma tarde de rolezinho

Esther Solano Gallego: Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Complutense de Madri e professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de São Paulo.

O sábado estava marcado um dos hipercomentados rolezinhos no Shopping Aricanduva.

Moro muito longe desse shopping, aliás, moro longe de maioria dos shoppings que protagonizam rolezinhos. Moro longe das periferias e as periferias moram longe de mim, o que significa que poderia passar minha vida toda em São Paulo comentando o que acontece nestes lugares distantes dos muros de meu condomínio sem nunca andar por lá.

Já debati muito, já julguei talvez demais sem conhecer de perto muitas realidades, mas o sábado pensei em deixar de especular sobre os outros desde meu território para ir ao território dos outros.  Fui, então, ao rolezinho do Shopping Aricanduva

Estes são os fatos que pude observar:

– Definitivamente o encontro era para paquerar, beija e ser visto.  Os adolescentes agendam sua presença via Facebook,  se produzem  segundo a lógica feminina do  shortinho e a lógica masculina do boné Quicksilver,  aparecem em grupos, se olham, se “fiscalizam”, e depois voltam para casa e escrevem no site do próprio evento “alguém me viu?”. Quem viu e gostou do fulano o adiciona a seus amigos do Facebook e, caminho livre…

-Além da segurança do shopping, três carros da Polícia Civil estavam presentes no evento, segundo eles me disseram, “dando apoio”. Ou seja, não mais do que 200 adolescentes se divertindo mobilizaram todo um corpo de segurança e vários efetivos policiais.

Até aqui os fatos. Seguindo, minhas rudes conclusões:

– É necessário sair de nossas regiões de conforto e aprender outras dinâmicas sociais antes de nos lançar em análises se não arbitrárias, talvez precipitadas e incompletas. O simples fato de me aproximar de estes jovens, conversar com eles, escutar, observar, já foi um grande aprendizado. Aquele tipo de aprendizado que não teria tido dentro dos muros de meu condomínio.

– Que sociedade tão obsoleta a nossa se um ato tão coloquial, cotidiano, simples, leve, como colocar as melhores roupas e ir paquerar ao lugar do momento cria uma neurose social. Não se escandalizem propondo rolezinhos na biblioteca porque duvido muito que alguém, na idade adolescente, acostumasse a passar as tardes de sábado lendo a Hegel. Não se escandalizem acusando estes jovens de ostentadores porque já vi ostentações muito mais extravagantes. Basta caminhar pela nobre região sul de São Paulo.

-Que sociedade tão sinistra a nossa que responde a umas dezenas de adolescentes paquerando num shopping com polícia.

Em definitiva, saiamos de nossos condomínios. Aprendamos outras realidades. Julguemos menos e observemos, conversemos mais. Nisso consiste formar parte de uma sociedade.

 

Luis Nassif

8 Comentários

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  1. Na minha juventude, uai, lá

    Na minha juventude, uai, lá no interiozão do país, toda tarde, ôxente, na pracinha do centro da cidade, havia um rolezinho e era bem democrático.

    Inté, as filhas dos coronés participavam.

    Só dava rolo quando uma delas começava a engordar.

  2. Esses rolezinhos sempre
    Esses rolezinhos sempre consistiram nisso, não é nenhuma novidade, a novidade aqui é essa aversão a essa frequência nos shoppings. Uns falam de prejuízos, danos causados pelos adolescentes, mas na verdade o que ocorre, é que, com as brincadeiras, as pessoas, inclusive lojistae, se assustam, fecham lojas, clientes correm, ou seja, criam a própria confusão e o pânico.

  3. A senhora viu um rolezinho e eu vi outro.

    Eu vi adolescentes correndo, gritando, lutando uma imitação de capoeira e fazendo acrobacias dentro de um lugar fechado. Crianças (sem idade ainda de serem preconceituosas) se assustavam e choravam, pediam pra ir embora. Os pais tentavam levá-las ao estacionamento, mas não havia um caminho seguro.
    De minha parte eu achei foi divertido. Estava sem nada pra fazer, não tinha sacolas nem crianças nos braços, sou um homem forte, não tenho medo de nada (exceto daquele motorzinho do dentista) e estava de bermuda e tenis – o que me permitiria correr se necessário (não foi necessário). Mas fico imaginando se eu fosse um idoso, um cadeirante, uma mãe com um filho no braço. Nesse caso eu teria tido, de fato, bastante medo. Qualquer um teria.

  4. Um fenômeno – enquanto

    Um fenômeno – enquanto fenômeno – inteiramente fabricado por uma Mídia preocupada em caotisar o Brasil. Ninguém precisa ir até a periferia para saber disso. Sorry…

  5. Que bonitinho……

     

    Mas então de onde de saíram os vídeos com pessoas correndo, aquela algazarra, aquele caos.?

    Será que ela está se referindo ao mesmo fenômeno…?

    Ou será que já chegoiu atrasada…?

    Então todo mundo fez um escândalo por causa de um monte de adolescentes que queriam namorar…..que incomporeensiva é

    a nossa sociedade…!

    Ô NASSIF..! Ela está falando de outra coisa…!

  6. “Que sociedade tão obsoleta a

    “Que sociedade tão obsoleta a nossa se um ato tão coloquial, cotidiano, simples, leve, como colocar as melhores roupas e ir paquerar ao lugar do momento cria uma neurose social.”

    Ora, ora, o permanente medo das “classes perigosas”. Afinal, “sabem o que fizeram no passado”.

    E a rapaziada sabe disso! Não venha me dizer que quem mora na periferia ou favela não sabe muito bem quais são os ambientes e situações em que são “tirados” de cima a baixo.

    Podem ter consegujido “domesticar” esses ou aqueles que são chamados na tv pra dizer “não fiz nada demais”. Mas, quem nunca ouviu um adolescente falar isso?

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